sexta-feira, 31 de julho de 2009

Queimando Tudo


Capa do Live at Star Club

Depois do escândalo envolvendo sua vida pessoal e o casamento com sua prima de segundo grau, Jerry Lee Lewis sofreu uma espécie de suicídio cultural. Foi banido da memória musical da conservadora, bizantina e calvinista América dos anos 50. seus discos não eram mais produzidos, não mais vendiam e só tocavam no programa do mítico DJ Allan Freed, que foi o único do meio que abraçou a causa do cantor e pianista, nascido no sudeste dos Estados Unidos.

Lewis chamou a atenção por fazer uma espécie de crossover entre o country e o boogie, porém tocando de forma mais vigorosa e entusiástica. Além do mais, mesmo sendo convencido a desistir do piano e tocar guitarra, como todo mundo fez quando nasceu o rockabilly, Jerry Lee foi até o fim, com todas as forças.

O resultado é que ele conseguiu uma vaga como músico de estúdio na Sun Records. Tocou com Cash e Carl Perkins — o piano de Marchbox é dele. Ou seja, Lee praticamente foi um dos pioneiros na consolidação do instrumento dentro do rock.

Porém, Lewis foi julgado pela sua forma despojada de tocar e pela suposta lascívia de algumas letras, como Whole Lotta Shakin' Goin' On, o que era comum com boa parte dos roqueiros daquele tempo. Little Richard, que copiara o penteado igual ao do Esquerita (um topete do tamanho de um chapéu coco), provocava um misto de escândalo, pânico e frisson quando aparecia na tevê. Algo que, uma década e meia seria considerado, vamos dizer assim, antiquado.

Mas depois de 1958, Jarry foi banido da história. Conseguiu relativo sucesso com um cover de What'd I Say, de Ray Charles, porém cantando sob pseudônimo (The Hawk). Mas foi prontamente desmascarado e banido dos broadcastings de novo.

Contudo, enquanto a América lhe virava as costas (profetas são sempre rejeitados em sua terra), Jerry Lee passou a se tornar cultuado na Europa, especialmente Inglatera e Alemanha, a partir de meados dos anos 60. Isso possibilotou a ele uma nova turnê ao Velho Mundo, em 1964. Conseguiu um contrato para tocar no Star Club de Hamburgo. Recém inaugurado (em 1962) no Reeperbahn, região licensiosamente boêmia da velha cidade hanseática. Ali, ele travou contato com um dos muitos conjuntos britânicos que tocavam lá — os Nashville Teens.

Lee conseguiu um contrato com a Philips para transformar o show em disco. O que parecia apenas uma apresentação registrada ao vivo (algo que era mais comum em selos de jaz e de blues do que do rock) se tornou um dos maiores discos do gênero em todos os tempos. em treze canções, ele escreveu a sua profissão-de-fé.

Mesmo que aquilo soasse ultrapassado, ainda que a geração da British Invasion tivesse beatificado aquele som, Lewis mostrava que tinha pela noção de seu talento e da sua capacidade de se mostrar original, desafiador e às vezes até ligeiramente iconoclasta ao tocar seus sucessos de forma deliciosamente garageira, quando em geral se prezava sempre o bom mocismo musical.

Além das canções mais conhecidas(Whole Lotta Shakin' Goin' On, High School Confidential e Great Balls Of Fire), ele ataca com velhos (forma de dizer, já que não eram tão velhas na época) standards do rock, como Good Golly Miss Molly, Hound Dog, Matchbox e Long Tall Sally e toca até Hank Williams (Your Cheatin' Heart, em sua melhor versão, mostrando também suas influências do country), Ray Charles (What'd I Say) e uma versão irresistível de Money (That's What I Want), clássico dos primórdios da Motown, e que, naquela época, já fazia a cabeça da juventude dos anos 60.

E o interessante é que a linguagem dos Nashville Teens é um upgrade sonoro que catalisa o ímpeto de Lewis, num som mais cru e barulhento que as antigas versões da Sun, mais contidas e com menos percussão. No fim, ele toca aquelas mesmas canções porém com uma vitalidade e energia fora do comum.

Jery Lee foi (justmente ou injustamente?) execrado e banido por sua música e sua conduta numa época e num contexto histórico que não demorou a ruir por suas próprias contradições. Mas os deuses do rock lhe compensaram tamanha injustiça, lhe concedendo a vida eterna.








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quarta-feira, 29 de julho de 2009

Sentimentalmente Patsy


Capa do Sentimentally Yours

Patsy Cline foi uma das maiores cantoras norte-americanas do Século 20. Só não foi maior porque ela fazia questão de ser, antes de mais nada, uma honesta e insuspeita country singer.


Detalhe: o country, como nós conhecemos hoje, na verdade,é uma espécie de anacronismo que foi criado pela indústria musical do sul dos Estados Unidos. Nashville era a terra do Grand Ole Opry (programa de rádio que mandou o melhor do country éter afora já a quase um século) e a meca da maioria dos artistas do gênero. Porém, até a era do Hank Williams, esse estilo tinha raízes muito fortes no folk e no honky-tonk, um tipo de música caipira de bar.

O nome "honky tonk" é uma onomatopéia para designar o som do piano de saloon que, na maioria das vezes, estava sempre meio desafinado e queimado de bitucas de cigarro.

O honky tonk era elemntar e rude, mas extremamente popular. Nashville queria conquistar um público maior e resolveu domesticar o country.

Owen Bradley, produtor musical que, naquele tempo, trabalhava na Victor, juntou um time de músicos, entre eles Grady Martin, Bob Moore, Hank Garland e Buddy Harman e, junto com a visibilidade gerada pela audiência devastadora do Grand Ole Opry em todo o território ianque, resolveu atravesar o Rubicão: deu um blend essencialmente pop no country, colocou backing vocals de extremo bom gosto, orquestra de cordas e tudo o mais. Foi o começo do estúdio B da RCA. Foi o que faltava para que surgissem cantores do estilo de Faron Young, Don Gibson, Lefty Fritzell e, principalmente, Jim Reeves.

Mas o Nashville Sound precisava de uma musa, e Owen achou essa musa — Patsy Cline. Ela havia largado o primeiro casamento (o marido queria que ela fosse uma reles dona de casa), e se lançou como cantora. Conseguiu um contrato meio de risco com Four Star, que além de subestimar o seu talento, queria que ela cantasse só material da editora musical deles.

A coisa mudou de uma forma bizarra: em 1957, eles queriam que ela cantasse um tema antigo, Walkin' After Midnight. Patsy não gostou nem um pouco. Para ela, era apenas mais uma canção pop antiquada, e não queria gravar.

Foi esa música que a catapultou aos píncaros da fama, quando ela foi descoberta no Arthur Godfrey's Talent Scouts. Godfrey gostou tanto da música que insistiu até o limite das suas forças para que ela cantasse esse tema. Foi tamanho o sucesso que ela não pôde acreditar. Resultado: Walkin' After Midnight foi gravada e a música chegou ao décimo segundo lugar na Billboard Pop. Cline foi a primeira country singer a conseguir a façanha.

Contudo, por conta do contrato leonino com a Four Star, ela não conseguiu
(de só gravar as músicas do selo) e , somado ao fato de ela ter dado luz à primeira filha, Patsy deu uma sumida por um bom tempo.

Retornou à música em 1961, quando o contrato expirou e Owen Bradley conseguiu que ela virasse estrela da Decca. Ela sempre foi extremamente grata pelo papel de Owen em sua carreira, mas smepre implicava como fato de que ele queria que ela fosse uma pop star, não uma cantora de country. Mesmo assim, no fundo ela sabia de que lado o vento soprava. Conseguiu outro êxito com I Fall To Pieces e virou a diva maior do Grand Ole Opry nos anos 60.

Um acidente de carro nessa época quase lhe tirou a vida, mas ela voltou ao disco em 1963, no disco Patsy Cline Showcase . É certamente o álbum mais conhecido de Patsy e que marcou o auge da sua carreira (interrompida num acidente aéreo, no ano seguinte).

Foi quando Willie Nelson (curiosamente o maior "inimigo" do Nashville Sound, taxado de fora-da-lei no mundo country bem vestido, Nelson lhes deu um dos maiores sucessos de toda a história) lhe ofererceu Crazy. Ela, como sempre, achou a canção "pop demais" e " muito difícil de cantar". Mas também como sempre, acabou gravando. Chegou ao nono lugar na Billboard Pop. Com Crazy, Cline virou figura de proa na mundo country, numa época em que cantoras geralmente eram crooner de "segunda linha" no organograma dos conjuntos do gênero.

Mas o seu disco mais bonito é, sem dúvida, o Sentimentally Yours. O disco é mais ou menos uma seleção dos seus sucessos recentes mais algum material novo (por exemplo, o cover de Your Cheatin' Heart, clássico póstumo do Hank williams, é da última sessão do disco). Um exemplo é a primeira faixa, She's Got You, de Hank Cochran (mesmo autor de I Fall To Pieces). essa, pelo menos, ela fez questão de gravar. She's Got You também seria o seu primeiro grande sucesso na Inglaterra.


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domingo, 26 de julho de 2009

Ítem de Colecionador


O No Stone Unturned, de 1973

No tempo do long-play, era quase tarefa de gincana sair pelos sebos atrás do material que os Rolling Stones haviam lançado em compactos e EPs e que, naturalmente ficara de fora de álbuns de carreira &, principalmente, de coletâneas.

Em geral, eram B sides & faixas de extended plays que, pelo fato de serem obscuras, ou ficavam quase inéditas em relançamentos ou saíam em discos que, há muito tempo, já estavam fora de catálogo. A Decca chegou a colocar boa parte dessas faixas em compilações que foram editados na década de 70, mas que estavam fora de catálogo há muito tempo.

De forma ligeiramente oportunista, o selo colocou as faixas em quase uma dúzia de coletâneas de títulos que eram lançados sempre que os Stones saíam em turnê. O Metamorphosis, por exemplo, saiu junto com a Tour Of Americas.

A coisa só mudou (não necessariamente para melhor) quando, em 1989 (quando o quinteto britânico pôs o Steel Wheels no mercado), a London lançou o Singles Collection. Essa é mais completa seleção de compactos da banda de Mick Jagger, embora a maior parte do material tenha saído em álbuns de carreira.

Explica-se: nos Estados Unidos, tudo o que os Stones lançavam de forma esparsa em singles e EPs era reaproveitado (mais ou menos da mesma forma que a Capitol fazia com os Beatles). Eles juntavam um punhado de canções, e lançavam uma coletânea como se fosse um disco oficial.

Um exemplo clássico é o December's Children, que é um saco de gatos, e foi lançado como o disco natalino, em 1965.

O problema é que muitas desas coletâneas pós contrato com a Decca Records marcaram época, ainda mais aqui no Brasil. Não há colecionador ou rato de sebo que não se lembre (ou não tenha achado) de discos como o Rock'n Rolling Stones, Stone Age, Milestones, Slow Rollers.

Algumas tinham capas feíssimas, mas sempre traziam uma música que a gente não tinha na prateleira ou o compacto estava gasto, empenado ou pulando (ou as três coisas ao mersmo tempo). E, como a maioria daqueles discos sessentistas da London não saíram no Brasil (exceto o Out Of Our Heads americano e o December's Children, que aqui se chamou As Tears Go By), o jeito era apelar para esses adoráveis caça-níquels.

Curioso é que, mesmo depois do advento do CD, a Decca/ABCKO continuou nos esquizofrenizando com esas coletâneas sem pé nem cabeça.

Mas eu dizia que alguns discos marcaram época, e um exemplo é o clássico No Stone Unturned. Lançado em 1973, ele é totalmente composto de lados B de singles. E mesmo que sejam faixas pouco conhecidas, o disco parece ter vida própria: é delicioso de ouvir.

Por exemplo, Poison Ivy e Money são do primeiro Extended Play deles, de janeiro de 1964; The singer's Not The Song é B de As Tears Go By, de 1965; 2120 South Michigan Avenue é do EP inglês Five By Five;

Child Of The Moon (genial, genial) é B de Jumpin' Jack Flash; Surprise, Surprise não havia saído em LP no Brasil; I'm Movin' On é do EP britânico Got Live If You want It! (não confundir com o álbum, gravado um ano depois, em 1966), Stoned é B de I Wanna Be Your Man;

Sad Day é B de 19th Nervous Breakdown; Congratulations só havia saído nos Estados Unidos no 12X5, um disco que era o EP Five By Five com material do segundo álbum inglês (além da foto da capa); Who's Driving Your Plane, bluseira fantástica que eles nunca tocaram ao vivo, é B de Have You Seen Your Mother, Baby, Standing in the Shadow? e Long Long While B do compacto inglês de Paint It Black.



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sexta-feira, 17 de julho de 2009

Os Selvagens de Newcastle


O quinteto

Os Animals não eram a melhor banda de blues rock da Invasão britânica. Afinal, havia ainda os Yardbirds de Clapton, Dreja e Page, depois os Bluesbrakers de John Mayall, o Blues Incorporated do Alexis Korner, o Manfred Mann que, a despeito de fazer sucesso com singles que eram puro udigrúdi pop, como "Doo Wah Diddy Diddy" e "Pretty Flamingo", tinham uma sonoridade que era muito mais blueseira em seus álbuns de carreira. Isso sem contar nos Rolling Stones de Brian Jones e companhia.

No entanto, a banda de Alan Price foi a que naturalmente conseguiu extrema visibilidade quando o rock inglês entrou rachando nas paradas de sucesso norte-americanas, a partir de 1964.

Uma virtude dos Animals é que, contrário de boa parte das bandas britânicas do gênero e do mesmo nível, o quinteto não mudou o estilo para produzir singles de sucesso (ao contrário dos Yardbirds, por exemplo, com For Your Love): apostaram numa fórmula simples de R&B limpinho, cheiroso & extremamente comercial, e em cover escolhidos a dedo (mas não muito obscuros),que iam de Ray Charles, Bo Diddley, John Lee Hooker & Nina Simone.

E, como na maioria do cast da British Invasion, mesmo sendo apenas uma banda de covers (o maior sucesso composto por eles mesmos é “I’m Crying”), eles conseguiram o que poucas bandas (como os Beatles) inglesas conseguiram — um número 1 na Billboard, com justamente um cover: “House Of Rising Sun”.

Alan Price pegou uma canção folk tradicional americana e mudou o foco narrativo da letra, de um homem arrependido para uma mulher que chora por conta do desregramento moral de seu marido — e, junto com os Animals, resolveu ensaiá-la para tocar como número de encerramento de sua apresentação durante uma turnê com Chuck Berry.

O impacto foi surpreendente> Logo, eles seriam convidados a gravar, por intermédio de Mickie Most (mesmo produtor dos Hollies), um single para a Columbia. A voz rascante de Eric Burdon e o órgão solene e marcante de Price, que se destacava sobre todos os instrumentos foi para o topo das paradas, em setembro daquele mesmo ano, ou seja, no auge da Beatlemania. Em novembro, partiriam para uma turnê em solo americano, participando do Ed Sulivan Show — era o auge. Até Agnaldo Timóteo gravou House Of Rising Sun, aqui no Brasil.

O estrondoso êxito continental de “House Of Rising Sun” garantia vida longa aos Animals que, em sua formação original, lançaram dois álbuns nos Estados Unidos (que, curiosamente, não continham o seu melhor número).

Garantia, porque logo o abuso de drogas (segundo afirmava o baixista, Chas Chandler, que fez com que eles torrassem todo o dinheiro ganhado em pouco tempo) e brigas constantes entre Price e o resto da banda fez com que ele deixasse o quinteto.

A despeito de todo o sucesso, o problema dos Animals residia num detalhe: gravar músicas ora sob encomenda (como “We Gotta Get Out Of This Place”, que com algumas modificações, virou outro mega-sucesso deles, e que se tornou um hino dos soldados ianques no Vietnã), ora apenas standards de blues e R&B restringia muito o horizonte musical deles, numa época em que as bandas de rock começavam a compor suas próprias canções e a contextualizar o seu som em discos com temática comum. A versões amwricanas dos seus bolhachões não diferenciava da maioria dos lançamentos ingleses na terra de Harry Truman, eram apenas mash ups de versões britânicas.

Do contrário, eles apenas gravitariam eternamente em torno de Burdon — coisa que não aconteceu, por exemplo, com os Rolling Stones.

Foi mais ou menos o que aconteceu, até o fim. Mesmo citando discos como o ótimo Animalization (de 1967), nenhum álbum se tornou clássico na fase áurea do quinteto (com Price nos teclados).

Alan foi substituído por Dave Rowberry. O grupo de Newcastle duraram mais um ano e maio, até que Burdon, se intitulado Eric Burdon And The Animals, se sentindo musicalmente tolhido pelo estilo comercialóide de Most, radicou-se nos Estados Unidos e partiu para uma irregular carreira solo.

Contudo, em 1966, a MGM (a distribuidora da banda nos Estados Unidos) lançou o primeiro "greatest hits" do quinteto britânico, o The Best Of The Animals, que chegou ao sexto lugar na Billboard (justamente por conter “House Of The Rising Sun”). O disco foi o recorde de vendas da banda e ficou na parada por mais de dois anos.

Nenhum demérito pelo fato de que era apenas uma coletânea, já que mercadologicamente falando, todos os discos lançados até então também eram.

Em tempo: Dave quem está na foto da capa (acima), e não Alan Price.



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Duke e a Suíte do Harlem


Duke e Billy

Duke Ellington estudou música clássica quando aprendeu a tocar piano, desde muito jovem; porém, como muitos doseu tipo,ele sentiu que o conhecimento erudito não iria lhe trazer o que ele realmente queria desbravar naquele instrumento.

Com essa educação empírica, ele se tornou pianeiro na noite, mas logo descobriu o potencial que havia em formar uma banda. A coisa ia deslanchar quando King Oliver lhe deu espaço no Cotton Club, em Nova Iorque, nos anos 30.

Nos próximos quinze anos, o grande maestro (e compositor) iria florescer, e ele entraria num circuito comercial que culminaria na Era do Swing. Contudo, o atavismo "erudito" de Ellington era forte e, depois de chegar ao Carnegie Hall, Duke começou a compor de forma mais acurada e elaborada que o jazz comercial que tocava nas rádios.

Ao mesmo tempo, ele conheceu alguém que iria influenciar sua música, e seu nome era Billy Strayhorn, um pequeno grande gênio musical, que ao mesmo tempo em que o estimulava a criar peças maiores que o formato de 78 rotações permitia, lhe permitiu que transformasse a própria forma comercial do jazz que ele produzia.

O maior sucesso da dupla saria Take the "A" Train. Curioso é que Strayhorn compôs a peça e a jogou no lixo, achando que o aranjo era cópia de Fletcher Handerson (de quem Billy era fã incondicional). Mercer, filho de Duke, pegou o manuscrito e resolveu investir nele — e deu certo.

A história é que Strayhorn pegava sempre o trem A que ia do Brooklin até o Harlem, onde ele trabalhava com Ellington. Tanto o ritmo da viagem quanto o arranjo para sopros de Fletcher inspiraram Billy para Take The "A" Train, que misturava a sofisticação da música sinfônica num formato simples e comercial — típico das músicas estilo "swing" que faziam sucesso na época.

Com o tempo, ela ganhou letra, e sobreviveu á própria extinção da Era do Swing. Primeiro, com o lockout musical da II Guerra Mundial (gravadoras não podiam mais prensar discos por um breve e crucial período, nos anos 40), a falta de mão-de-obra (músicos eram recrutados para o front), de matéria-prima (em vez de trompetes, fabricava-se apenas armas de fogo) liquidaram com uma geração.

Depois, a guerra acabou e a alternativa do jazz virou algo ligeiramente anti-comercial e menos dançante, o Be Bop. Salões de baile acabaram, programas de rádios e Ellington saiu de cena.

Pelo menos, para compensar tantas perdas, nesse meio tempo o formato long-play surgiu e Duke põde se dedicar a fazer a um tipo de música que lhe cairia bem, que era amalgamar o jazz tradicional (que ele notabilizou) em um formato camerístico, ou seja, mais para ouvir do que para dançar.

Convidado pelo produtor da Columbia, George Avakian, Ellington compôs o álbum (de estúdio, já que o de Nweport e o Soul Call são geniais também) que eu considero a sua obra-prima: a suíte Uptown. É uma suíte em cinco partes, sendo que o mote do disco é, justamente, Take The A Train (no entanto, na edição Masterpieces (foto), ela saiu como a faixa 1). No entanto, na sua melhor versão.


A capa

Ela tem quase o formato de uma abertura (A-B-A) e é uma espécie de prelúdio ao álbum — que só não foi chamado de "conceitual" porque alguém esqueceu de catalogá-lo desta forma. Destaque para os solos memoráveis de sax de Paul Gonsalves (se Billy era o braço direito de Duke, Paul era o esquerdo).

O disco não é feito de material original — Take the 'A' Train," "The Mooche," "Perdido"), as mini-suites ("Harlem Suite," "Controversial Suite," e a "Liberian Suite") foram publicadas muito antes do lançamento de Uptown, em 1953. E "Skin Deep" é uma versão de Louis Bellison, percussionista de Duke. As quatro danças que constam no relançamento são bônus tracks.

1 — Skin Deep
2 — The Mooche
3 — Take the "A" Train
4 — A Tone Parallel to Harlem (The Harlem Suite)
5 — Perdido

Duke Ellington — Uptown

Saxofones: Paul Gonsalves, Harry Carney, Jimmy Hamilton, Russell Procope, Hilton Jefferson
Trompetes: William Anderson, Clark Terry, Willie Cook, Ray Nance
Trombones: Juan Tizol, Quentin Jackson, Britt Woodman
Bateria: Louis Bellson
Contrabaixo: Wendell Marshall
Piano: Billy Strayhorn, & Duke Ellington
Vocal (em Take The "A" Train: Betty Roche.



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sexta-feira, 10 de julho de 2009

A musa "desagradável" do folk


Odetta

A voz dos movimentos pelos Direitos Civis. Não. Não é exatamente quem vocês devem estar pensando. A voz dos movimentos pelos Direitos Civis tinha que nascer no Sul e ser negra, e se chamar Odetta Gordon. Tinha formação clássica, mas preferiu cantar spirituals e blues, cair na estrada e aprender com músicos mambembes canções que, em uma década, se tornariam o repertório do revival do gênero folk em terras americanas, a partir da segunda metade dos anos 50, com o retorno dos Weavers às paradas, depois de anos de perseguição provocados pelo Macartismo.

No volume primeiro de suas suas Crônicas, Bob Dylan disse, a respeito do gênero musical em que ele gravitou, no início de sua carreira: "o que eu tocava (fim dos anos 50) eram canções com letras fortes e atrevidas, e você não precisa de pesquisas de opínião para saber que elas não combinavam com nada das rádios".

De fato, canções de protesto nunca possuíram nenhum appeal comercial, pelo menos até que aparecesse gente como Harold Leventhal e Albert Grosmann, que conseguiram transformar o folk em um negócio prá lá de rentável.

Mas tudo isso não faria sentido se não fosse o revival do gênero, que floresceu no fim dos anos 50, possibilitou o surgimento do Festival de Newport e o surgimentou de uma nova geração de artistas, influenciados por leadbellys e guthries.

E o mais importante de tudo — se não fosse o surgimento do Movimento pelos Direitos Civis. Era preciso que nascessem canções com uma temática realista, por que não dizer, "desagradável", que incomodasse. E o folk era a doença fácil que eles precisavem pegar. Dylan, em suas memórias, diz achar que a América precisava passar por isso:

— Falando em termos práticos, a cultura dos anos 50 era como um juiz em seus últimos dias de magistratura. Estava prestes a desaparecer. Em um período de dez anos, tinha lutado para se erguer & então se esborracharia no chão. Com canções folclóricas incrustradas na minha mente como uma religião, isso não impórtava: as canções folk transcendiam a cultura imediata — escreveu.

Mas ele sabia qual era o limitee o alcance daquele tipo de música: "ou eu mandava (com o material temático) as pessoas embora ou elas chegavam mais perto para ver qual era. Não havia meio termo. Havia um monte de cantores melhores (...) o folk era a maneira de eu explorar o universo, eram imagens, e as imagens valiam mais do que qualquer coisa que eu pudesse dizer".

Esse era mais ou menoso caso de Odetta, de quem Dylan sempre foi um admirador confesso. Ela era uma força da natureza, ventava, relampejava, chovia, ardia, com o seu jeito de cantar & o seu vibrato trovejante. Não era bonitinha e frágil como Joan Baez. Podia tanto fazer as pessoas chegarem mais perto quanto as mandarem embora. Mas mesmo as que se afastavam ficavam incomodadas. Odetta não causava frission, perturbava. Basta ver sua memorável performance interpretando Water Boy no documentário No Direction Home, do Martin Scorcese. Ela canta como se estivesse furibunda, mal contendo uma mágoa incontornável, uma dor indissimulável.

Odetta pode ser comparada a Herry Belafonte: surgiram exatamente na mesma época, eram artistas negros e, embora tivessem crescido em centros urbanos(ela em Los Angeles & ele em Nova Iorque), a sua música tinha profundas raízes no folk.

No entanto, ele fez mais sucesso (principalmente cantando calipsos, como Jamaica Farewell). É que Belafonte tinha um gravíssimo defeito: não incomodava como Odetta. Odetta perturbava, trovejava, relampejava, era um vendaval, uma borrasca, um tsunami sonoro. Todos queriam chegar mais perto para ouvir o Day-O de Belafonte. Mas Odetta mandava todo mundo embora. Essa era a virtude de Odetta: ela era desagradável e sublime.

Todo mundo? Não. Quem permanecia para "ver qual era", acabava se apaixonando por Odetta. Ela podia fazer você derrubar bastilhas e decaptar marias antonietas. Ela criou uma geração de entusiastas de ouvintes e jovens músicos, do Kingston Trio até o próprio Bob Dylan (que o fez largar o rock em favor do folk), que não sossegou enquanto não decorou de cor e salteado um disco que ninguém mais ouve hoje: Odetta Sings Ballads and Blues.


O disco

Lançado em 1956, é o seu primeiro trabalho solo e é um punhado de canções tradicionais, reelaboradas por ela ao violão. A primeira parte compreende temas que vão do blues ao gospel — com exceção de Santyanno, uma conhecida canção do mar (cross the river from Liverpool, heave away, Santy Anno, around Cape Horn to 'Frisco Bay, 'way out in Californio), que depois seria regravada pelo Kingston Trio — mas numa versão inferior, ou seja, "agradável". Mas a versão de Odetta vale pelo disco inteiro. O lado B é mais voltado a spirituals como I'll Be On My Way e God's Gonna Cut You Down. Um clássico.


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terça-feira, 7 de julho de 2009

Wagner Para Crianças


Spector e o Back To Mono

O período entre 1959 e 1964 foi conhecido na historia da música como os anos em que o “o rock morreu”. Desde o desaparecimento trágico de Buddy Holly até a Invasão Britânica, houve um hiato de cinco anos em que as guitarras calaram. Como se sabe, o gênero não morreu de todo, mas estava apenas se preparando para as boas vindas, quando os Beatles aterrisaram pela primeira vez em Nova York.

Naquele intervalo, porém, surgiu um fenômeno típico do começo dos anos 60 – era o tempo do “doo up” e das “girl groups”. Mesmo que hoje soem kitsch, como que “de época”, esse estilo idílico e romântico (que também surgiu com o advento da Motown), fez a carreira de compositores célebres como Carole King e produtores idem como Phil Spector.

Como arranjador, ele surgiu como um furacão avassalador, legando à posteridade clássicos como “ Be My Baby” e “ You've Lost That Lovin' Feelin'” e criando uma especialidade de registro sonoro artesanal que deixou centenas de seguidores, o famigerado “wall of sound”. Já o melhor da sua produção (basicamente singles) está na caixa Back To Mono (1958-1969).

Hoje habitué de páginas policiais, Spector começou como integrante dos Teddy Bears, em 1958. Cedo abandonou os mocrifones em favor da sala de controle. Por ter ouvido perfeito, como aprendiz de Jerry Leiber e Mike Stoller em Nova York, ele passou a desbravar todas as possibilidades de um estúdio de gravação, fazendo arranjos para dezenas de artistas. Nessa fase ele produziu compactos para gente como La Vern Baker, Ruth Brown, Top Notes (que criaram “ Twist And Shout”), Billy Storm.

Também surgiram clássicos como “ Spanish Harlem” (Ben E King), “On Broadway” (Drifters), “ Corrina, Corrina” (Ray Peterson) e “ Pretty Little Angel Eyes” (Curtis Lee).

De volta à Los Angeles, em 1961, ele vira um intrépido freelancer, trabalhando em selos como Liberty ou Capitol, com a ajuda de Lester Sill, o empresário que o apresentou a Leiber e Stoller.

Nessa época, eles se unem na Phillies (junção de seus nomes), dirigida por ambos, e Spector trabalha em sua própria gravadora, enquanto presta serviço à outras. Para a Phillies ele produz Ducanes, The Creations e Crystals; por fora, ele trabalha com Connie Francis, Gene Pitney e The Blue Jeans, entre muitos outros. Nas paradas de sucesso, ele quase sempre batia na trave, até chegar ao segundo lugar em 1963 com “ Be My Baby”, interpretado pelas Ronettes.


Phil Spector e a Parede -
Por trás da belíssima voz de Veronica Bennett (ou Ronnie Spector), “ Be My Baby” foi um marco nessa trajetória e escancarou uma revolucionária e artesanal técnica de estúdio, que Spector utilizava desde que conheceu o Gold Star, em Los Angeles: a “ parede sonora, ou “Wall Of Sound”. Ali Spector observou todas as possibilidades de usar as cãmaras de eco.


Estella, Veronica (Ronnie) e Nedra: as Ronettes

Ele teve a idéia de passar o som do estúdio de gravação para essas câmaras, provocando um reverberar que reforçava e emoldurava o som original que, dali, ia direto para a sala de controle. Assim, a “ Parede Sonora” lhe permitiu trabalhar diversas possibilidades de montar a música, ao mesmo tempo que ele experimentava naipes de cordas e metais misturados com instrumentos simples de percussão, como castanholas, ou sinos, reco-recos e carrilhões. Tudo isso embalsamado pelo eco característico das câmaras do estúdio.

Mais do que mero capricho ou fetiche, a “ Wall Of Sound” se tornou uma marca registrada: a qualidade do registro tenha uma fidelidade melhor do que o Hi-Fi quando emitida no rádio.

Logo, não seria difícil reconhecer uma gravação típica de Spector, que saía rachando dos speakers, retumbante como um tutti de uma abertura de Richard Wagner. Aliás, era justamente esse o impacto que ele queria: criar o contraste da simplicidade da música ligeira com a nota complexa da orquestra, e a percussão ora leve como palmas solitárias ou o estrondo grave de tímpanos.

Wanger para crianças - O compositor Jeff Barry, que trabalhou com Phil Spector, definou a “Wall Of Sound” como uma fórmula tão básica quamnto bombástica: quatro ou cinco guitarras, uma orquestra de cordas, dois contrabaixos, seis ou sele trompetes, tímpanos, sinos, maraca e pandeiro. “Phil tinha a sua própria receita para o eco, em alguns arranjos fora do tom com as cordas, mas em geral o segredo era a fórmula do arranjo”, diz.

Essa técnica também podia ser representada como o contraste entre a voz nua e crua em concerto com uma hercúlea base sonora – ou, como ele mesmo definiu, “uma sinfonia de atmosfera wagneriana para crianças ouvirem”.

Talvez a magna expressão desse paradigma spectoriano e de seu respectivo processo de gravação está na fantástica “ You've Lost That Lovin' Feelin”, dos Righteous Brothers (e que abre o CD 3 de Back To Mono).

Spector conheceu a dupla (Bill Medley e Bobby Hartfield) em 1965, e os contratou para gravar na Phillies. “ You've Lost That Lovin' Feelin” chegaria ao primeiro lugar nas paradas, e lançaria a dupla também com sucessos como “ Just Once In My Life”, “ Unchained Melody” e “ Ebb Tide”.

Nessas gravações, e principalmente em “ You've Lost That Lovin' Feelin”, Phil insere um gigantesco coro celestial, maracas e pandeiro em reverber, mais vibrafones e harpiscórdio – uma pequena obra-prima.

A partir dali, a indústria fonográfica não seria mais a mesma: outros produtores adotaram a técnica de Spector, ou então perceberam que esse trabalho de fundo dava mais visibilidade aos discos.

A própria Capitol criou, anos mais tarde, o “New Improved Full Dimensional”, um processo mecânico que melhorava a mixagem dos fonogramas, e que se tornou mania entre os colecionadores de discos até hoje. Outros literalmente usavam os estratagemas do criador de “To Know Him Is To Love Him”: Johny Rivers tenta recriar a mesma atmosfera da parede sonora em “Baby, I Need Your Lovin'”, só para ficar em um exemplo.

Mais: “ Be My Baby” virou a cabeça de Brian Wilson. John Lennon e George Harrison estenderam um tapete vermelho para o produtor, que trabalharia com ambos no começo de suas carreiras solo – não sem antes embalsamar o canto do cisne dos Beatles com o seu “ Wall of Sound”, o Let It Be.

Há quem diga que Paul McCartney não gostou do resultado, mas ele utilizou o arranjo de “ The Long And Winding Road” em suas turnês, nos anos 90...

Apesar do sucesso, depois de “ You've Lost That Lovin' Feelin”, Spector cansou do ofício de produtor, abrindo raras exceções. Como ele mesmo dizia, seu negócio era fazer compactos em mono. Antes dos Beatles, ele só havia trabalhado em um álbum, a coletânea A Christmas Gift To You.

De qualquer maneira, o recado estava dado: o melhor de sua música está nas sessenta músicas do mosaico de Back To Mono – desde e época dos Teddy Bears, passando pelos primeiros discos, como a linda “ I Love How You Love Me” (Paris Sisters), “Zip-A-Dee-Doo-Dah” (Bobby Soxx And The Blue Jeans) , “ Heartbraker” (Crystals), “ I Love You (For Sentimental Reasons)” (Righteous Brothers), “Wait Till My Bob” (Darlene Love) e “Hold Me Tight” (Treasures, cover dos Beatles), até “Save The Last Dance For Me” (Ike & Tine Turner). Enfim, do tempo que Phil Spector era barra limpa.

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domingo, 5 de julho de 2009

Clapton, calças boca-de-sino, canções de amor & outras questiúnculas


O disco

Se Clapton foi Deus, um de seus maiores momentos de divindade foi num disco chamado Layla And Other Assorted Love Songs.

Sua história, no entanto, é bastante rocambolesca. Eric havia deixado o Cream em 1968, farto de ter que mediar as brigas entre Ginger Baker & Jack Bruce. Sozinho novamente, ele resolveu convidar outro ilustre desgarrado, Steve Winwood, que havia deixado o Traffic. Juntos, decidiram formar uma (outra!) super banda que misturasse blues em improvisações jazzísticas.

Com a idéia de conceber um quarteto, contataram Ric Grech, do Family e Ginger Baker. Clapton não tinha a intenção de reatar com o ex-colega tão pouco tempo depois da tensa e tumultuada separação; contudo, o timorato Steve o convenceu que, por sua técnica ímpar, Baker seria essencial nos planos do grupo recém formado.

O projeto, porém, como não poderia deixar de ser, durou pouco menos de um ano (cerca de quatro meses, nem isso), & rendeu uma turnê nos Estados Unidos e um disco (que o ilustre leitor deve também deve ouvir antes de morrer, embora este não conste na lista dos 1001).

O Faith, como qualquer banda claptoniana, nasceu para ter vida breve: acabou no fim de 1969. Foi nesse período que Eric decidiu participar de projetos aleatórios como side man band, como a Plastic Ono Band e da Delaney & Bonnie and Friends (que abriam os shows do Blind, junto com o Free), até que, depois de algum tempo, ele acabou optando por colaborar efetivamente com a turma de Delaney. Foi ali que Clapton conheceu o tecladista Bobby Whitlock, que se tornaria seu parceiro musical nos anos seguintes, primeiramente nas sessões de All Things Must Pass, o segundo álbum de George Harrison (o primeiro foi Wonderwall, de 1968), e depois no primeiro solo de Eric, de 1970.

Nesse período, o guitarrista inglês começou a se entregar a dois vícios avassaladores em sua vida: a heroína & a pior delas, uma modelo inglesinha na flor do tesão, Patti Boyd, porém dedicadíssima esposa do seu melhor amigo e parceiro musical (Badge), o discretamente nirvânico ex-beatle George. Pois conhecê-la foi como um cofre de repente caísse em sua cabeça: Clapton se apaixonou perdidamente pela moçoila, a ponto de uivar noites e noites para a lua de tantas saudades.


Com vocês, Layla

Foi um TENSO amor de perdição: ele a cortejava, dardejava olhares mortíferos, mandava cartas, lhe dava mimos. Ele não sossegaria enquanto ela não correspondesse aos seus arrufos. Pois nesse clima idílico que nosso herói, junto com Whitlock — mais Jim Gordon (bateria e piano) e ninguém menos que o virtuose slide guitar Duane Allman resolveu fundar outra banda, Derek And The Dominos. À princípio, o que ele tinha em mente era tão somente criar um repertório novo para tocar em pequenos clubes ingleses, junto com alguns covers de blues. A idéia iria render frutos suficientes para que o grupo fosse parar no estúdio.

Noves fora, tirando números magistrais como uma emocionante versão de Little Wing, de Jimi Hendrix, Key To The Highway ou Nobody Knows You When You're Down And Out, Layla And Other Assorted Love Songs é uma linda e comovente declaração de amor a Patti Boyd. Ela é o seu mot de spirit, seu combustível vital, sua razão de viver; ela aparece nas letras o tempo todo: em Tell The Truth, ele diz: “não importa onde você está ou quem você é, abra seus olhos e ouça o seu coração”, ou em Why Does Love Got To Be So Sad (“não sou o mesmo desde que te vi (...) começo a ver o tolo em que você me transformou, preciso rasgar as leis quando eu te encontrar”). Há ainda momentos escandalosamente autobiográficos, como Have You Ever Loved A Woman (“você sabe que ama aquela mulher, sabe que é vergonhoso & é pecado, & o tempo todo você sabe que ela pertence ao seu melhor amigo”), a belíssima Bell Bottom Blues (que se refere às calças boca-de-sino, o último grito da moda ianque, mimo que ele deu para Pattie quando ele voltou dos Estados Unidos.

A linda e triste e subestimadíssima I Looked Away, que é beleza pura (“ela pegou em minha mão e me fez compreender que estaria sempre perto de mim, mas ela foi embora hoje e eu sou um homem solitário”). &, por fim, é claro, a preferida de nove entre dez claptonmaníacos — Layla, que além de escrever especialmente para a esposa do seu melhor amigo, Clapton, como uma pedra rolante em sua desmesurada paixão, doente e perdidamente louco de tanto amor, ainda teve o disparate de mostrar a gravação para ela, em primeira mão.

Disse a doce e compassiva Pattie em suas memórias: “nós nos encontramos em segredo em um apartamento em [South] Kensington. Eric Clapton me pediu para ir para escutar uma nova música que ele havia escrito. Ele ligou o gravador, aumentou o volume e tocou para mim a música mais poderosa e tocante que eu já havia escutado. Era “Layla”, sobre um homem que se apaixona perdidamente por uma mulher que o ama, mas não está disponível.

Ele tocou para mim duas ou três vezes, olhando meu rosto a todo momento para ver minha reação. Meu primeiro pensamento foi: “Oh Deus, todo mundo vai saber que é prá mim”.

Era o primeiro capítulo de uma novela que estava apenas começando...

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Hendrix (do fundo do baú)


Jimi

Momento GERACOLETÂNEA, ctzzzz! Vasculhando os meus alfarrábios, ontem, achei uma pasta perdida com uma pequena porém valiosa rescolta de material alternativo (ou bootleg) do Jimi Hendrix. Metade são apresentações ao vivo, metade outtakes de estúdio. Segue a lista:

1. Can You See Me (ao vivo em Berkley, em 1970)
2. Hey Joe (Monterrey Pop, 1967)
3. Burning Of The Midnight Lamp (das sessões do Axis: Bold As Love & foi gravado em Los Angeles. É provavelmente a última sessão de gravações com o Chas Chandler na produção. Como todos sabem, ele abandonaria o Hendrix no começo das sessões do Eletric Ladyland, em 1968)
4. Hear My Train A-Comin' (versão de estúdio, em 1969)
5. Little Wing (ao vivo no Royal Albert Hall)
6. Red House (ao vivo, na minha nada humilde opinião a melhor versão de todas)
7. Villanova Junction (versão de estúdio, a maioria conhece apenas a do Woodstock, que o Jimi toca depois de Voodoo Child)
8. I Don't Live Today/Hey baby (New Rising Sun) (Berkley, 1970)
9. Izabella (no Dick Cavett Show, som marromenos, vale mais pelo registro histórico)
10. Killing Floor (Monterrey Pop, 1967)
11. Voodoo Child/Hey Joe/Sunshine Of Your Love (BBC Lulu Show, 1969, é aquela gravação que aparece no BBC Sessisons, porém sem a edição do CD de 1999)
12. White Nigger (prá quem não sabe, o Hendrix participou das sessões do primeiro disco do Stephen Stills, em 1970. White Nigger é uma raridade que ficou de fora do disco).

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sexta-feira, 3 de julho de 2009

O selvagem do trompete


Imbatíveis: Prima & Kelly


Louis Prima não é muito lembrado hoje, mas ele foi um dos maiores artistas de smooth jazz dos anos 50. Trompetista e dono de uma voz um tanto característica, nasceu na mesma cidade de outro Louis, Louis Armstrong, e sempre foi comparado à Satchmo como a sua versão ítalo-americana. A diferença fundamental, porém, residia no fato de que Armstrong tinha uma outra escola, a de Papa Joe — King Oliver, extremamente selvagem & revolucionária (gênio dos gênios ao lado de Bach, na minha nada humilde opinião) enquanto Prima fez o seu nome durante a Era do Swing, tocando em big bands.

Outra diferença é que o ápice da careira de Armstrong se deu na Era do Jazz, nos anos 20 e 30, quando lançou uma série de gravações em 78 r.p.m que são o evangelho do gênero em todos os tempos, enquanto Prima se tornou mais conhecido nos anos 50 quando, junto com um combo chefiado por Sam Butera (sax tenor que era o solista dos Witnessess) & com sua (belíssima, deusa) consorte, Kelly Smith, criou pocket-shows que marcaram época naqueles sisud(íssim)os anos 50.

O magnetismo e o sucesso das apresentações chamou a atenção da Capitol Records, que sugeriu que Louis transpusesse o espírito pitoresco e muito bem humorada da sua performance de palco em disco. Assim nasceu The Wildest! Lançado em 1956, virou fenômeno de vendas — principalmente pela versão personalíssima de Prima para um medley de duas cançonetas do tempo da Primeira Grande Guerra, Just A Gigolo e Ain't Got Nobody. Para quem não ouve (ou não gosta/ & ou acha coisa de tiozão, etc), é um achado.

Louis Prima era imbatível nos anos 50: transformou Las Vegas na meca da perigrinação da nova onda do Swing em terra ianque. Os shows eram divididos em performances solo dos Witnessess, de Prima no vocal principal e de Kelly, respectiva e alternadamente, interpretando standards de jazz, como "Autumn Leaves" (Mercer) e "I've Got You Under My Skin" (Porter).

Um desses shows, felizmente, foi registrado e, quase meio século depois, foi lançado em CD: Louis Prima e Kelly Smith From Las Vegas.



Gravado no Hotel Sahara, em 1958, o CD (duplo) mostra exatamente como era assitir a uma performance de Prima e Keely: ele, elegante como um dândi, com terno de tweed inglês, aparentemente ciscunspecto mas extremanente cômico e ela, misteriosa e exótica, misturando momentos de sublime sensualidade e melancolia (que voz, meldels) com tiradas surpreendentemente cômicas (quem já ouviu o The Wildest! sabe do que eu estou falando). Mas o que poderia ser reles & banal é mágico: com um repertório impecável: "Nothing Can Replace a Man", "Too Marvelous for Words", Gershwin ("Embreaceble You") e, como não podia deixar de ser, "Buona Sera", clássico na voz de Prima.

Em tempo: existem outros discos de Louis Prima.

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Canções Para Corações Partidos


Sinatra

Quando alcançou o zênite de sua carreira como cantor e ator, Frank Sinatra era simplesmente o maioral, rico, cheio de amigos e emparedado de mulheres. Muito além de ser A Voz, aquele rapaz magrinho e de orelhas de abano era simplesmente o rei na arte da conquista. Para se ter uma idéia de suas virtudes donjuanescas, durante as filmagens de A Lua ao Seu Alcance (Higher and Higher, 1943), nos estúdios da RKO, Frankie colou no espelho do seu camarim uma lista com as vinte mulheres mais cobiçadas de Hollywood. Enquanto arrumava o nó de sua gravata borboleta, ele jurou, para um amigo: “Vou comer todas elas”. Apostou e levou. Foi numa progressão fulminante.

Antes do término das gravações, ele já havia riscado várias em seu caderno. Lana Turner, Judy Garland, Kim Novak, entre outras. Na lista dos “casinhos”, ele guardou na rede Lauren Bacall, Doris Day, Marylin Monroe, Juliet Prowse, Jill St. John, Jaqueline Bisset, etc, etc. O filme já estava em cartaz, mas Sinatra estava muito longe — ele poderia ficar rico só no bookmaker. Na época, ele estava casado (com Nancy Barbato, mãe de Nancy “Something Stupid” e Frank Jr.).

Essa vida dura acabou quando ele conheceu Ava Gardner. A estonteante Ava Gardner de One Touch Of Venus, no papel da mesma (qual mais??) deusa do Amor, qual Marte nenhum sequer sonhara. Era de botar qualquer Catherine Zeta-Jones no chinelo. Em 1954, Ava já era considerada (“machistamente”, é claro) o animal “mais lindo do mundo”, quando estrelou A Condessa Descalça (The Barefoot Condessa, 1951).

Uma bombshell cuja sugestão do talhe, os ombros alvos e largos eram capazes de fazer os homens soltarem fumacinha pelos ouvidos (como nos desenhos do Pica-Pau) com seu sorriso estonteante e seu olhar matador. Ela foi um furacão na vida de Sinatra. Gardner também foi o estopim do divórcio de Nancy com Frank. Ele decidiu largar tudo por aquela paixão fulminante. Em questão de semanas, em 1951, Sinatra chutou um casamento de 12 anos para se casar com aquele furacão-mulher, aquele animal estraçalhador de corações. Ela estava no esplendor dos seus 29 anos.

Tapas & Beijos - Na época, aquele consórcio parecia o Olimpo. Contudo, para a maioria dos biógrafos de Frank Sinatra, se tratou do marco inicial da decadência musical do cantor.

Teria sido aquela morena de pernas de seda e de seios de granito que lhe sugaria quase toda a sua saúde até o derradeiro suspiro de prazer. Depois do amor, eram cadeiras e candelabros voando, mesas surradas e partidas ao meio enquanto aquela relação entre tapas e beijos ganhava as manchetes dos principais jornais, numa riqueza de detalhes que chegava ao paroxismo da verossimilhança de fofoca.

Sinatra era literal e prazerosamente esporeado por aquele animal de ombros alvos como um luar de Cruz e Souza. Seis anos depois, veio o golpe fatal.

Ava Gardner estava corneando o todo-poderoso A Voz com um obscuro toureador espanhol, Luiz Domenguin. Parecia uma cena de ópera, e era. Só que Frankie desempenhava o papel de Dom José numa tragicômica versão tex-mex hollywoodiana de Carmen.

Chifrado por um toureador. Isso deve ter latejado em sua mente até a morte. Imaginar aquele animal enfurecido domesticado por um desconhecido, aquela insaciável mulher sendo parada por um pano vermelho pôs o Don Juan a pique. Sinatra sentiu o golpe. Na verdade, um sonoro pé na bunda. Ao mesmo tempo, ele sentiu que não era mais o mesmo ídolo da Era do Rádio de algum tempo atrás.

Sua voz estava mudando de um som de violino para viola, ao mesmo tempo em que sues canções foram se tornando “quadradas” em comparação a um então obscuro ex-caminhoneiro de Tupelo, Missouri, chamado Elvis Presley, e que cantava um tal de rock’n roll. Pelo menos no quesito cabelos, Frank não poderia suplantar o topete do jovem cantor. Pelo contrário, precisou imaginar seu perfil no espelho com um simpático chapéu, que seria a sua marca registrada (até que o chapéu caísse de moda).

Pior: ele teve que reavaliar sua carreira e esquecer o tórrido e tumultuado romance com Ava Gardner. Além do mais, ele não era mais o crooner, era Frank Sinatra. Tinha luz própria e um talento singular. Na verdade, ele deveria começar de novo, apesar da latejante chifrada. Para acompanhar sua voz, ele necessitava de bons músicos, e de produções mais sofisticadas que meros compactos de 78 rotações.

Ao invés da música superficial e dançante dos tempos de “April in Paris” ou “Stella by Starlight”, naqueles arranjos superficiais dos tempos da Columbia, sua música precisava ser cerebral e hermética aos ventos da moda.

Para tanto, encontrou uma excelente gravadora, a Capitol, e um arranjador idem, chamado Nelson Riddle (também depois viriam Billy May e Gordon Jankins). A parceria Riddle/Sinatra marcaria época naquele selo, e seus arranjos seriam os melhores de Frank até o fim da vida. Quando o Ol’Blue Eyes gravou seu derradeiro disco Duets (1994), os arranjos eram os mesmos dos anos 50. Cada tremolo nos violinos, cada solo de trumpete, eram suas marcas registradas.

A Bossa e a Fossa - Para sua nova fase, ele guardara a influência de Dorsey e de Billie Holiday em sua forma de cantar. Mais sóbrio, mais trabalhado, menos histriônico, porém mais pensado. Mas ele ainda tinha vontade de cantar, depois daquela chifrada da Ava?, pode perguntar o leitor. De certa forma, sim.

Porém, a influência da atriz ainda lhe investia de uma certa carga negativa e que só lhe permitia conceber um canto soturno como o da saudosa juriti. Uma juriti descornada, diga-se de passagem.

Falando sério mesmo, ele só conseguia pensar em coisas tristes. “What is this thing called love/ Just who can solve it's mystery/ And why should it make a fool of me?”. A canção era de Cole Porter, mas parecia uma composição do próprio Sinatra, quando ele registrou-a no disco antológico que se chamaria In The Wee Small Hours. Não, não era de propósito: aquele seria mesmo um álbum triste.

Álbum? Em 1955, era difícil imaginar o que seria um disco de 12 polegadas. O famoso “bolachão”, forma carinhosa pela qual nós chamamos o velho vinil, ainda era uma novidade. Até então, os long-play eram prensados em 10 polegadas, e as capas não eram lá muito bonitas. Os discos vinham enfeixados em dura capa de cartolina, porque o vinil daquela época podia se espatifar no chão em mil pedacinhos, como um vaso da dinastia Ming.

Para um disco com maior duração de tempo, era preciso inovar. Como primeira colaboração de Riddle com Sinatra, na Capitol (onde ficaria de 1953 a 1961), o álbum seria uma rescolta de dezesseis canções — releituras de números de Duke Ellington, Carmichael, Porter e Rodgers & Hart mais ou menos com um tema comum (baladas-tristes-para-um-homem-soturno-a-acalentar-seu-orgulho-ferido).

Quase que de forma involuntária, Sinatra seria o precursor do chamado “álbum conceitual”, um programa de canções designados para serem ouvidos dentro de uma seqüência que sustenta um estilo e conta uma história particular.

A capa sugere o clima do disco, com um retrato de Sinatra meditabundo na esquina, sob a tíbia luz de um poste acordado em pleno fog da madrugada azul em pélago, enquanto nosso herói fuma um cigarro vagabundo. O curioso é que, nos álbuns seguintes, Frankie voltaria à velha forma, já como factorum do show biz, para então marcar época emplacando sucessos como “All The Way”, “Night And Day”, “Cheek to Cheek”, “Chicago”, “Dancin’ In The Dark”, onde ele esculpiria o paradigma do Frank Sinatra intérprete, que ficaria na retina de seu público para sempre.

In Wee Small Hours era o batismo do novo Sinatra para o ministério do maior cantor de todos os tempos, e que definiria uma forma única de cantar — até que ele se tornasse a paródia de si mesmo, no fim da carreira, mesmo sem perder jamais a forma (apesar do uísque lhe criar aquela folclórica barriga-de-marido e aquele suspiro capilar no teto).

Mas a figura central de In Wee Small Hours sempre será Ava Gardner, aquele agressivo e impudico animal de pernas de seda e seios de granito em cujas curvas Sinatra capotou seu coração (desculpem, não resisti). Muitos diziam até que o sofrimento de A Voz influenciou decisivamente a interpretação de “When Your Lover Has Gone”.

Riddle assombra ainda mais a tristeza do cantor no tema do clarinete em “What Is This Thing Called Love” e a devastadora evocação de sozinhez de “It Never Entered My Mind”. De qualquer maneira, a chifrada saiu barato para aquele ilustre filho de Hoboken, New Jersey, que antes soube relegar a posição da orquestra para segundo plano (com relação a ele) para, depois, mudar o seu estilo de interpretar para um nível mais elevado e que fundaria o cantor.

É certo que sua vida particular foi apenas o estopim de um gestação que levou quase uma década e também passou pelo êxito como ator oscarizado (em A Um Passo da Eternidade) nos anos 50.

Não fosse por tudo isso, talvez Sinatra seria hoje tão anacrônico quanto Dick Haymes ou Bing Crosby — mas não menos genial. O mesmo Sinatra que registrou Wee Small Hours também emplacaria no topo das paradas Where Are You? (1957), o primeiro gravado em estéreo, e Only The Lonely (1958), que formam uma trilogia intensa, de tão irmãos em seu formato singular de suíte musical e tão intimistas em sua proposição sonora.

A partir de Wee Small Hours, o crooner rodeado de bobbysockers mitômanas e diante daquele velho microfone art deco se transformaria no criador da mais bela trilha sonora de todos os tempos e uma das figuras mais importantes do cenário musical do Século 20. Se não o maior.

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O Elo Perdido

O amigo já ouviu falar na Política da Boa Vizinhança? Pois então: no tempo da Segunda Guerra Mundial, o governo dos Estados Unidos, então presidido por Franklin Roosevelt, durante a Conferência Panamericana de Montevideo, criou-se a Política da Boa Vizinhança. O objetivo era criar laços com países sul americanos, a fim de que não fossem aliciados pelo canto de sereia do Eixo e do Nazi-fascismo).

Com isso, muito da cultura brasileira virou destaque em terras ianques. Valia tudo (ou quase) para agradar o pessoal do lado de baixo da linha do Equador, a fim de que não passassam para o outro lado de Greenwich (não sei se me entenderam, paciência). Foi o auge do chica-chica boom de Carmen Miranda nas telas de cinema, Zé Carioca. Alguns não fizeram tanto êxito, como o malfadado filme É Tudo verdade, de Orson Welles (garoto-propaganda do Paul Masson e cineasta nas horas vagas) e um audacioso projeto fonográfico, idealizado pelo famoso maestro Leopold Stokovski (aquele que musicou o desenho animado Fantasia, de Walt Disney), e que se chamaria Brazilian Native Music.


A capa do disco histórico, gravado clandestinamente
e inédito em vinil e em CD no Brasil

Quando ele chegou aqui, em 1940, ele se espantou com a qualidade precária dos conjuntos que tocavam nas rádios do país. Como ele aportou em terras brasileiras para gravar um disco que fosse registrar o que ele sonhava como o que representasse o, vamos dizer asim, “autêntico som brasileiro”. O certo é que muitos selos brasileiros da época tinham (enormes) restrições para colocar regionais de samba no mercado, nunca chagaram (pelo menos, até então), a gravar batucada comme il fault. Pois esse era o espírito do projeto — baucada roots na veia. Mas, e o público-alvo do álbum, a tradiconal família norte-americana, acostumada com o samba domesticado de Carmen Miranda e do Bando da Lua, iria conseguir entender Native Brazillian Music?

Então Stokovski procurou o seu conhecido maestro Vila-Lobos. Como era grande amigo de Pixinguinha, ele pediu ao autor de “Carinhoso” para que recrutasse a nata do samba.
Sem dificuldade, ele juntou Luís Americano, Zé da Zilda, Zé Espinguela, Jararaca, Ratinho, o jovem cartola e muitos outros ritmistas e instrumentistas para gravar, a bordo do navio S.S Uruguay, oito discos que, no espírito da “Boa Vizinhança” seriam vendidos nos Estados Unidos. E, com a moda brasileira de Carmen Miranda na América, teria êxito fácil.

As gravações foram um mistério. A gravadora de Stokovski, a Columbia, tinha estúdios no Brasil, mas ele preferiu conduzir todo o projeto sozinho, dentro do Uruguay. Ou seja, mesmo existindo um escritório comercial, editoras e gente de lá trabalhando na subsidiária daqui, ninguém ficou sabendo daquelas sessões que Leopold iria fazer, na calada da noite, no Rio de Janeiro.

Stokovski recepcionou os bambas recrutados pelo intrépido autor das Bachianas Brasileiras. Realizou um ágape com eles e depois os colocou para gravar o que lhes viessem à cabeça. E, em apenas oito horas, ele gravou cerca de quarenta números.
Entre os temas, estavam “Quequerequequê”, de João da Baiana (o precursor do prato-e-faca no samba), “Pelo Telefone”, “Quem me vê Sorrindo” (de Cartola, cantado por ele mesmo e que, por incrível que pareça, ele nunca ouviu a sua versaão original, que seria regravada por ele, só nos anos 70, com o revival da sua música, anos após o advento do Zicartola), dentro outros sambas, batuques, frevos, fantasias sobre macumba e muito mais. A qualidade dos registros foi totalmente improvisada e rápida, o disco saiu nos Estados Unidos, mas não fez o sucesso esperado.

A Columbia alega que perdeu os originais (embora a pesquisadora Daniella Thompson, num trabalho incansável de pesquisa, defende que o selo ainda as possua) e ele ficou esgotado por anos, até que apareceu em sites da Internet para download ilegal. O disco não foi lançado no Brasil, mas, uem ouviu, disse que, a despeito da qualidade de época e de ter sido transposto para o formato digital a partir dos 78 rotações, a crueza pura das faixas e o registro em si, são dignas de menção pelo valioso registro histórico que elas representam.

Abram alas, porque Native Brazillian Music, uma obra-prima da Velha Guarda, não passou.

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quarta-feira, 1 de julho de 2009

Joaozinho da Bahia

Ou as peripécias de um curioso músico baiano pelas noites de Porto Alegre

No começo da década de 50, o melhor conjunto vocal em terras brasileiras se chamava Quitandinha Serenaders. O grupo nasceu pelas mãos do lendário produtor musical Carlos Machado, e era formado, em sua maioria, por gaúchos. Ele os batizou assim quando elas cantavam no também lendário Hotel Quitandinha, em Petrópolis, região serrana do Rio de Janeiro, no tempo em que o estabelecimento era um cassino (os cassinos foram fechados durante o governo Eurico Dutra, em 1946). O fim da jogatina transformou o fumacento cassino em um hotel sóbrio. O conjunto deixou Petrópolis rumo às boates do Rio de Janeiro, mantendo o mesmo nome.

O grupo era formado pelos gaúchos Luís Telles, os irmãos Paulo e Alberto Ruschel (ator do filme O Cangaceiro), Francisco Pacheco e Luís Bonfá (pai de Marcelo Bonfá e autor de clássicos como Gentile Rain e Manhã de Carnaval).

O líder era Luís, homem bondoso e timorato. Morando na capital federal, Telles participava do ambiente musical daquele tempo, da boemia carioca e, como não poderia deixar de ser, a rádio Nacional. Também conheceu grandes figuras da época: Assis Valente (Brasil Pandeiro), Paulinho Tapajós, o estreante João Donato (de A Rã) e Bororó, entre outros.

Um dia, ele conheceu um jovem de vinte e quatro anos, chamado por todos como Joãozinho da Bahia. Joãozinho era um guri contemplativo, muito sensível, tinha excelente memória musical e tocava violão. Através de amigos, descobriu que o rapaz não tinha dinheiro, nem trabalho e poucos amigos.

Andava pelas boates de Copacabana, mas não entrava nelas (não tinha dinheiro). Ficava na calçada mesmo, cabelos quase caindo nos ombros, barba de semanas e roupa amarfanhada. Não podia voltar para casa, não conhecia ninguém que morasse em outra cidade.

O músico dos Serenaders descobriu também que o estado de Joãozinho era devido ao uso constante de maconha, que era fartamente distribuída pelas noites cariocas. Decidiu tirar o menino daquela situação terrível, levando-o para conhecer os ares de Porto Alegre, da próxima vez em que fosse desembarcar na capital gaúcha.

Também convidou o rapaz para participar do Quitandinha, embora ele nunca fosse realmente um membro do grupo. Também conseguiram para o baiano um teste de voz e um contrato num clube noturno, mas ele recusou ambos, mais por ser tímido e exigente demais.

Acabou ficando todo o começo de 1955 em Porto Alegre. Luís Telles hospedou o guri no luxuoso Majestic (hoje tombado como centro cultural). Tão logo se adaptou ao hotel, Joãozinho começou a chamar a atenção de mensageiros, telefonistas, camareiras, hóspedes e até os proprietários do lugar.

Todos ficaram encantados coma sua fineza e com o seu talento ao arranhar, distraído, um violão. Telles também arrumou apresentações perto dali, no bar Farolito, na mesma rua do Majestic, numa esquina da avenida dos Andradas. Levou o menino também ao Clube da Chave que, na época, era bastante freqüentado por não ser um bordel, como a maioria dos inferninhos existentes na capital.

Com o tempo — e por causa de Luís, todos na cidade o chamavam, simplesmente, de Joãozinho. Um dia, João não quis tocar. O violão emprestado tinha cordas de aço. Aturdidos, fizeram uma vaquinha e lhe arrumaram outro, novamente reprovado pelo jovem baiano. Com o novo “pinho”, desta vez, aprovado pelo guri, Telles levou o músico iniciante por todos os lugares: em programas de auditório, botecos do Mercado Público e o afamado (termo que se dizia então) Clube do Comércio, que era freqüentado pela fina flor da boemia bem vestida de Porto Alegre.

Magérrimo, quase alto, quase médio, já sem aquele cabelo de esquizofrênico e barbas de poeta beat, o baiano dormia muito pouco. Passava o dia no quarto do hotel, tocando violão e comendo bergamota (tangerina). As arrumadeiras do Majestic sempre se deparavam com inúmeras cascas da fruta pela cama.

Tontas, descobriram que se tratava de um padrão: todo dia ele fazia isso. Achavam que o hóspede estava ficando maluco, mas ele explicou, depois.

Ele colocava as casquinhas ali para que as formigas viessem lhe fazer companhia. Todo fim de tarde, vestia o seu único e fora de número (curto demais) casaco (na verdade, um sobretudo Príncipe de Gales emprestado por Telles ao seu pupilo) para se apresentar ou encontrar conhecidos, quando a boca-da-noite se abria nas portas de vai-e-vem dos bares.

Quando precisou de um smoking, lhe conseguiram um — curto também. Ao se ver no espelho, apenas disse:

— Rui Barbosa...

A opinião dos seus ouvintes era sempre a mesma. O jovem demonstrava ser um virtuose em seis cordas, e conhecia uma quantidade exorbitante de músicas — algumas conhecidas, outras nem tanto, em sua maioria compostas por seu ilustre patrício, Dorival Caymmi. Contudo, a platéia não entendia como ele era capaz de descaracterizar as notas coloridas e dissonantes do violão de forma tão singular quanto inédita, naquele lugar.

Alguns especialistas e conhecedores de música, como o pianista Armando de Albuquerque, notaram que ele tocava sob influência de um ritmo que era estranho aos ouvidos brasileiros: parecia um misto de Stravisnky com Be-Bop. Se Joãozinho decidisse tocar uma de suas preferidas, “A Primeira Vez” (Bide-Marçal), sucesso de Orlando Silva, ou “Eu Sonhei que Tu Estavas Tão Linda” (Lamartine Babo), o resultado era algo muito diferente e mais intimista do que as originais. Mesmo criticado, ele conseguiu um fiel grupo de admiradores.

Falando em Orlando Silva, ao contrário do seu ídolo, Joãozinho tinha uma voz diferente do “Cantor das Multidões”, embora ainda guardasse ecos ao que se refere à empostação e os vibratos muito bem cuidados. Sempre precisava de microfone, mas não mudava a emissão de voz, sempre pequena, baixa, calculada, sem emoções exacerbadas, mesmo nos momentos cruciais. Às vezes, arriscava um Augustin Lara (“farolito que alumbras somente mi calle deserta”) arranhando um espanhol incompreensível de tão abaianado.

O acento nordestino do rapaz também era o algo a mais que o transformou numa pequena lenda pelas noites da capital gaúcha em meados dos anos 50.

Tempos depois, o baiano Joãozinho sumiu, de forma tão discreta quanto apareceu pela primeira vez aos olhos do pessoal do Clube da Chave, num longínquo janeiro de 1955. Seus amigos se espantaram com a ausência repentina. Nunca mais se ouviu falar do lendário jovem do nordeste, que encantava a assistência dos botecos de Porto Alegre como um Paganini em voz e violão. Nunca mais se soube que fim tivera o guri de Juazeiro, de sotaque peculiar e de modos esquisitos. Eventualmente, ele aparecia em rodas de conversa, no Largo dos Medeiros, no Centro, em frente à antiga Confeitaria Central. Perguntavam sobre Joãozinho.

Alguém ao ouviu falar a quantas anda o Joãozinho? Nada, ninguém sabia o que aconteceu com ele.

Em meados 1958, alguém jurou ter escutado uma voz parecida com a do violonista baiano. Entrou na loja de discos e reconheceu o mesmo rosto, num disco que fazia o maior sucesso no centro do país. Um grupo de admiradores de Joãozinho se amontoou na vitrine. Ouviam, reouviam, se entreolhavam, e não sabiam se acreditavam: é ele? Pediram para ouvir o 78 rotações, com cuidado. Ao prestarem atenção na batida sincopada do violão, a mesma divisão de frases. Todos foram unânimes. Era Joãozinho mesmo. O que os confundiu foi que o intérprete do disco de selo Odeon se chamava João Gilberto, “com Antônio Carlos Jobim e Orquestra”.


João posando com o pulôver de Ronaldo Bôscoli...

O disco era Chega de Saudade, cujo lado B era “Bim-Bom”, e que lançou a Bossa Nova.



Texto meu publicado pelo site Rabisco, há algum tempo atrás. Aproveito para repostar agora, que faz meio século do lançamento desse disco, que é básico em qualquer discoteca embora, infeliazmente, só possa ser achado na Internet.

Falando nisso, link nos comentários...

Cowboy Fora-da-Lei


O Homem de Preto tocando Long Black Veil para uma nada respeitosa camorra


Quando era apenas um jovem soldado da Força Aérea Americana, Johnny Cash assistiu a um filme B ligeiramente moralista, intitulado Inside the Walls of Folsom Prison. Das suas lembranças de pracinha em Londisburg, Alemanha Ocidental, no começo dos anos 50, o futuro compositor passou a projetar a sua carreira em letras que contavam as vicissitudes da vida observadas pelo ponto de vista do mais fraco.

Daí surgiriam canções que falavam de outsiders , de pátios de trem, de presidiários, vagabundos e toda a fauna da classe trabalhadora ianque: "Dark as a Dungeon", “Cocaine Blues”, "The Long Black Veil", “I Walk the Line” e “Folsom Prison Blues”, entre outras. Além disso, Cash se tornou célebre ao amalgamar ao estereótipo do ingênuo trovador de temas country uma imagem peculiar, típica de astros do rock, vestindo-se quase sempre de preto. Por detrás dos óculos escuros, pensava-se que havia um célebre ex-meliante, cujas canções apenas aumentavam este mito do cowboy fora-da-lei.

Embora tivesse problemas recorrentes com a Justiça, Johnny foi um “ habitué” de penitenciárias. Mesmo assim, tinha milhões de admiradores no sistema prisional. E além das cartas de histéricas e ululantes bobbysockcers , muitos dos seus missivistas viam o sol nascer quadrado: ele se identificava com eles e a recíproca era verdadeira, e amiúde ele costumava fazer récitas para condenados em todo o país.

Em fins de 1967, “JR” escolheu como símbolo de sua reabilitação na luta contra as drogas um concerto na mesma penitenciária do filme, que fica em Sacramento, Califórnia, e se tornou conhecida por abrigar Charles Mason (!). A idéia foi prontamente rechaçada pelos executivos da Columbia, sua gravadora. Um dos biógrafos de Cash, Michael Streissguth, editou um livro, intitulado The Making of a Masterpiece, onde conta a via crucis que o compositor singrou até levar o concerto para o disco (parte da história aparece no filme I Walk the Line ).

Streissguth revela que Clive Davis, presidente do selo, achava que aquilo iria acabar com a quase combalida carreira de Johnny. Outros foram além, e queriam que ele fizesse como os Byrds, e eletrificasse o seu country , para tentar aliciar um outro tipo de público, mais voltado para o glamour do psicodelismo da moda flower power . Ele bateu pé, e decidiu arcar com todos os custos para a gravação — equipamento, músicos, tudo. A Columbia, porém, cedeu o desassombrado produtor Bob Johnston (especialista na seção de country, já havia trabalhado com outros malucos antes, como Dylan em Blonde On Blonde) para as sessões.

Uma das histórias curiosas do disco gira em torno de um interno, chamado Glen Sherley, que havia composto uma canção. Cash ouviu-a através do capelão de Folsom (reverendo Gressett), na noite anterior ao concerto, realizado dia 13 de janeiro de 1968. Ele virou-se para JR e disse:

— John, eu quero que você ouça isto, foi escrito por um condenado a cinco anos por assalto à mão armada, e ele me pediu para te mostrar. Eu vi que você está ocupado, mas se você puder dizer amanhã que pôde ouvi-la, eu e ele ficaríamos imensamente agradecidos — disse o capelão.

— Você tem um gravador? — replicou Cash.

Um convidado, Gene Beley, e um repórter decidiram levar um gravador de rolo para registrar o show. Como todos tinham tempo — já que os músicos viajavam sob a neve (o Tennesee Three, mais June Carter e Carl Perkins), de Nashville até Sacramento, ele fez uma demo e decorou a canção.

Meu corpo pode estar entre as peredes de Folsom,
Mas o Criador já libertou meu espírito...,

Cash ficou sério. A música enchia o ambiente. De absorto, logo ele esboçava um sorriso entusiasmado — certamente lembrando dos tempos em que cantava gospel .Há uma capela de rochas aqui em Folsom

Uma casa de graças nessa caverna de pecados,
Você pode pensar que o Senhor tem um lugar aqui em Folsom,
Mas ele já salvou milhões de almas de homens perdidos.
Depois de ouvir e reouvir “Greystone House”, ele disse: “isso tem que sair em compacto e eu quero gravá-la na récita de amanhã”. Então ele se debruçou diante de uma mesa e anotou a letra no bloco de papel, enquanto batucava a letra com a caneta.
No dia seguinte, Cash vestia uma jaqueta azul e botas de rancheiro, quando viu Bob Johnston.
— Você é o produtor?
— Sim, é o que eu pretendo ser — riu Bob. Ademais, você tem alguém que o apresente no palco?

— Bem, acho que vou me apresentar eu mesmo!

Excelente, cara! Vai lá e diga: “olá, meu nome é Johnny Cash”. Eles vão ficar muito doidos!

Além dos internos, o resto de seu público também ficou. Tanto que At the Folsom se tornou um best-seller além das expectativas da Columbia, chegando junto aos Beatles na parada de sucessos. Porém, o disco levou algum tempo para ser lançado: os produtores achavam que versos como “I shot a man in Reno / Just to watch him die” não cairiam bem num momento em que a América pranteava a morte de Martin Luther King Jr. e Robert Kennedy, e segurou o lançamento do álbum por seis meses.

Sobre a importância do disco no âmbito dos anos 60, Michael Streissguth entende que o trabalho ao vivo de Cash pode entrar no cânone dos grandes discos da década, representado por ícones como Beach Boys ou Beatles. Para sustentar a sua tese, o autor insiste que muitos preferiram entender os sixties como uma época de reinvenção e experimentalismo, ao passo que valores como o humanitarismo e a solidariedade — como no caso de Luther King, Medgar Evers ou Dorothy Day, por exemplo — foram colocados em segundo plano.

Para Streissguth, ao representar a crônica da população menos assistida e a dos vencidos da vida e os desvalidos, Cash se insere na segunda fila. “ Folsom Prison representou aquela realidade social melhor que um caleidoscópio colorido”, diz. De acordo com ele, o disco se inseriu nos 60 despretensiosamente à sua maneira, resolvendo-se no âmbito daquela década “num momento de reestruturação de uma nova hierarquia social e política”.

Antes de análises e das palavras, contudo, vem a música. Controverso e quase um símbolo pop em um meio em que a maioria dos intérpretes era considerada caipirões simplórios, Cash se emerge como um rockstar e, ao mesmo tempo, um herói da classe trabalhadora. Nenhuma platéia podia melhor franquear esse título a ele, a não ser a dos detentos de Folsom Prision: a integração entre os músicos e a platéia é surpreendente, em matéria de cordialidade e empatia.

A atual versão em CD corrige erros de edição do lançamento de 1968. Porém, o disco digital lançado em 2000 ainda não contém todo o concerto, embora traga mais faixas gravadas naquela noite. Pelo menos quatro faixas não aparecem no relançamento, são elas “I'm Not in Your Town to Stay” “I've Got a Woman”, “Long Legged Guitar Picking Man” (que ele gravaria com June Carter, no seu trabalho seguinte) e uma versão alternativa de “Greystone Chapel”.

Johnny Cash: At The Folsom Prison, Columbia, 1968.


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