sexta-feira, 30 de abril de 2010
Surf's Up
Capa
De 1962 até 1966, os Beach Boys entronizaram um estilo musical original e marcante, que engloba vai desde Surfin’ Safari até o Summer Days (And Summer Nights), combiando canções sobre praia, carros, garotas e festas.
A partir dali, no entanto, eles entraram num impasse: se a fórmula estava dando certo, por outro, o rock estava mudando para um outro caminho, tanto ao tocnte à temática das letras quanto aos arranjos.
Como avalista musical da banda e produtor dos discos, Brian Wilson se distanciava cada vez mais dos seus colegas, elaborando arranjos cada vez mais difíceis e complexos. Inspirado no Rubber Soul, dos Beatles, ele decidiu elaborar uma produção típica de vanguarda — algo diverso da lingueam e do paradigma pop típico deglutido pela Indústria Cultuiral da época.
O seu próximo passo foi Pet Sounds. O problema foi que, saído de sua própria cabeça, Wilson fez praticamente tudo sozinho, com a ajuda de músicos mais experimentados do que seus colegas dos Beach Boys, e procurando um outro letrista. Brian convidou Tony Asher para a tarefa, e sugeriu que eles abandonassem a temática “praia-carros-garotas”. Mike Love destestou o resultado, e detestou mais ainda o fato de Wilson ter mexido na fórmula exitosa dos discos anteriores, mais o de haver procurado auxílio “alienígena” para o projeto.
O corolário foi que, de tão impctante e original, Pet Sounds foi incompreendido, foi mal nas paradas. Ainda fazendo ouvidos mouvos aos parceiros, resolveu ir além, criando uma suíte intitulada Smile, dessa vez contando com o auxílio de Van Dyke Parks.
Este, por sua ve, ao contrário de Asheer, não suportou a pressão de Mike e grande elenco e desistiu cedo do trabalho.
Brian queria, no entanto, levar o sonho de Smile até o fim, a qualquer custo. Porém, a pressão insistente de Mike Love, ao chamar o novo disco de “aliteração lisérgica” somada à desistência de Parks em permanecer e o insucesso comercial de Pet Sounds o levou a um colapso que fez com que o líder dos Beach Boys jogasse a toalha.
Além disso, o abuso de drogas ilegais e de anfetaminas agora estava pagando o seu preço, e sua saúde começou a declinar de forma considerável. Com as sobras de estúdio, os empresários do quinteto e Carl Wilson, que agora pegava as rédeas daquela diligência que descia ladeira abaixo, decidiram fundar uma gravadora (a Brother) e retomar os trabalhos.
Smile virou Smiley Smile, que contava com parte dos esboços de Wilson, que agora iria curtir um ostracismo para apenas retornar aos BB uma década depois.
O disco também foi um fracasso em vendas. O plano era agora tentar retomar o caminho enquanto o contrato com a Capitol encerrava, e de uma forma ligeiramente melncólica. Quando eles mudaram de selo, ficram livres.
Agora eles tinham um selo próprio (a disribuidora seria a Reprise), haviam colocado Bruce Johnston no baixo no lugar de Wilson e arranjarm um novo produtor, Jack Rieley. Dessa nova fase, o grupo lançou dois discos interessantes: Sunflower e este aqui Surf’s Up. O primeiro mostrava um processo diferente dos Beach Boys em estúdio: agora todos colaboravam com músicas e idéias, como Got To Know The Woman, escrita e interpretada por Dennis Wilson.
O resultado final, contudo, não os agradou — e daí surgiu a idéia de recrutar Rieley. Por su vez, ele sugeriu que Carl se tornasse o líder efetivo e que eles apostassem mais em letras que falassem de política e, sobretudo, de ecologia (como em A Day In a Life Of a Tree, contado no foco narrativo de uma árvore (!) e Don’1t Go Near The Water).
Mais ousado e menos pop que Sunflower, no entanto, ao escutá-lo, o ouvinte pode perceber que, mesmo que execrado e vivendo o seu triste auto-exílio, Brian ainda se faz ouvir nop som dos BB.
No fim das contas, eles abdicaram do modelo das músicas de outrora, que cheiravam a espírito juvenil e fizendo uso da mesma linguagem sofisticada que Wilson concebera, quatro anos antes. Nesse aspecto, Surf’s Up é um atavismo e Smile, como se eles houvessem totemizado o paradigma do ex-parceiro de banda.
Aliás, a faixa que dá título ao disco é mais uma das sobras do projeto inacabado de Wilson, e que ele só iria retomar (sem os Beach Boys e com Van Dyke Parks, em 2004. Porém, se a idéia de escrever letras ecológicas parecia interessante para todos, não foi para Bruce Johnston, que não gostou nem um pouco da interferência de Rieley na sonoridade dos BB e deixou o quinteto, logo após o lançamento, em agosto de 1971.
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quinta-feira, 29 de abril de 2010
Chá de Penico
Capa
Quem vê a postura de Rogério Duprat na clássica capa do álbum Tropicália ou Panis Et Circencis (1968) pode se escandalizar com a postura do maestro carioca, vestido como um músico de orquestra, e segurando um vetusto penico como se fosse uma xícara. A antítese do hábito classudo, típico de sala de concerto, e o chiste do “porta-reparo” traduzem exatamente o que ele foi: um happening peripatético.
A parte mais conhecida de seu trabalho como arranjador - e justamente o papel que o notabilizou na história MPB, está em sua notável participação para o movimento tropicalista, colaborando em discos de Gilberto Gil, Gal Costa, Caetano Veloso e Os Mutantes. Porém, o elo perdido de sua discografia, e quem sabe o menos conhecido, está em A Banda Tropicalista de Rogério Duprat.
Lançado em 1968, por muito tempo este trabalho foi renegado pelo autor, principalmente por causa da capa, que ele detestava, por supostamente se prestar como um mero pastiche dos Beatles.
Músico intuitivo, cedo aprendeu a tocar de ouvido. Ainda jovem, entrou na Orquestra Sinfônica de São Paulo. Contudo, para se sustentar, militava no rádio e na produção de discos e trilhas de filmes. Embora arranjador de raiz clássica em sua passagem pelo Conservatório Villa-Lobos, com o tempo Duprat acordou para a música de vanguarda. Sob influência de Hans-Joachim Koellreutter, que trouxe de suas viagens pela Europa do pós-guerra a novidade da chamada Escola de Darmstadt que, por seu caráter cosmopolita, tentava livrar a música do exacerbado nacionalismo (como Wagner durante o Nazismo), entronizado por movimentos totalitários.
Ao mesmo tempo, esse novo modelo fez o maestro carioca deixar o cânone nacionalista de Camargo Guarnieri e se aproximar dos concretistas (Haroldo de Campos, Decio Pignatari) e escrever na revista Noigrandes , no mesmo espírito vanguardista de Boulez e Cage de amalgamar a música da pintura e da poesia.
Música Nova
Junto com Júlio Medaglia e Damiano Cozzela, Duprat descobiu a música aleatória de Boulez e John Cage, ambos adeptos de teorias 'antimusicais', como o uso do ruído (sonoplastia, sons de transmissão de rádios, buzinas, aplausos) e do silêncio (como dizia Cage, do ruído que vem desse mesmo silêncio, como ele expõe em sua 4'33). Juntos, eles criaram o Música Nova, movimento cujo prospecto era acabar com o academismo da música erudita de casaca, para uma concepção mais aberta do gênero, de forma a que o clássico pudesse se relacionar com o popular – algo inconcebível na época. Duprat sentia esse preconceito, tanto que, no princípio da carreira como arranjador, tentava não associar o seu trabalho com o disco do oficio de câmera.
Em parte, o Música Nova seria a ruptura. Na Escola Politécnica da USP, junto com Cozella, Duprat criava com um gigantesco computador IBM 1620. Os happenings que ele fazia quando trabalhava eram elaborados com leitura de jornal, música com eletrodomésticos, o que parecia mais revolucionário do que a própria Revolução de 1964. Com a censura, ele se demite da UNB, onde trabalhava como professor.
Além do mais, como disse Rogério, para quem tinha mulher e crianças, o Música Nova não enchia a barriga de ninguém e ainda os transformava em agentes subversivos, que podiam mandar mensagens a células comunistas através de concertos (com “c” mesmo) de batedeiras e liquidificadores...
Foi nessa época que ele descobriu o rock dos Beatles, primeiro pelos filmes, depois através de uma banda de garagem que tocava no Bexiga, em São Paulo: Os Mutantes. O maestro, que andava a cata de um conjunto de Jovem Guarda, encontra em Arnaldo Baptista, Sérgio Dias e Rita Lee a melhor tradução do som dos cabeludos de Liverpool.
Por intermédio do também maestro Júlio Medaglia, Duprat soube que Gilberto Gil queria algo mais do que um arranjo comum para apresentar a sua música no Festival da Canção daquele ano. Também cogitou a possibilidade de tocar com um conjunto de rock. Foi quando Medaglia o apresentou a eles. Como disse o próprio Duprat em depoimento a Fernando Rosa e Alexandre Matias, foi a união da fome com a vontade de comer. “Estávamos todos a fim disso aí”, diz ele.
“Não é que eu fiquei dando aula para eles; ao contrário, eu que aprendi pra burro com os Mutantes, com o Gil, com o Caetano, com todo mundo, como fazer uma coisa, que pode ser ao mesmo tempo com uma certa correção, com uma correção que a gente já conhecia, de músicos, e fazer isso, de uma coisa popular e avançada, uma coisa na frente dos Beatles”. Era a gênese do Tropicalismo.
Surge a ... “Banda Tropicalista”
Se Panis Et Circencis logrou êxito como a manifestação musical da Tropicália, Duprat foi o Moisés que realizou a travessia do Mar Vermelho do erudito para o popular. Mais do que experimentalismos e arrojos orquestrais como o do Bumba-iê-iê-Boi de “Geléia Geral” ou a introdução “sideral” de “Não Identificado”, por exemplo. Mais: o maestro carioca tinha como característica a música eletrônica através dos seus princípios instrumentais e o chiste : a sua música era o chá de penico. “Nós tínhamos essa história de misturar (...) músicas, todos os tipos de música, e eu em especial tinha uma predileção por gozar a música, fazer gozação”.
Mantendo o limite da proposta séria de fazer a “nova música”, Duprat criou A Banda Tropicalista como uma inefável incursão pelas paradas de sucesso internacionais (nesse caso, imposto pela Polydor) e temas brasileiros, misturando e reelaborando estilos e gêneros, ou mesmo fundindo-os em pequenos medleys.
Quem conhece tanto o trabalho dos Mutantes quanto os arranjos do maestro nos álbuns de Caetano, Gil e o citado disco-manifesto já está familiarizado o suficiente para entender A Banda Tropicalista não como um mero apêndice , como pode parecer, mas sim como um complemento fundamental à discoteca básica do Tropicalismo.
Duprat não gostou do resultado, embora tenha gostado de algumas faixas. Para ele, a gravadora teria “forçado a barra” desde a arte da capa até à escolha do repertório (um misto de bubble gum hits em arranjos ao melhor estilo “easy listening”). Para quem não sabe da história por trás disso, acreditaria piamente que tudo não passava de mais um 'chiste' do maestro em alternar temas tão dispares como Lamartine Babo e Johnny Rivers, e ao mesmo tempo, soarem tão bem enfeixadas dentro do espírito tropicalista de digerir tudo na antropofagia sonora que defendia o movimento.
O disco:
Judy In Disguise: sucesso de 1967 do conjunto americano John Fred and the Playboys. Pérola do estilo bubblegum (músicas comerciais e, como sugere o rótulo, grudam no cérebro do ouvinte). Na verdade, é paródia de “Lucy in The Sky With Diamonds”, dos Beatles. Fez sucesso suficiente para desbancar os quatro cabeludos de Liverpool das paradas de sucesso por duas semanas (deixou “Hello Goodbye” em segundo), em janeiro de 1968. Duprat consegue colocar uma cuíca na introdução e a insólita buzina de caminhão pedindo passagem. O tema é tratado como uma saborosa gafieira, e serve de introdução (expõe um motivo no clarinete que será retomado mais tarde). O caminhão passa novamente antes do retorno do tema principal, até o fim.
Honey/Summer Rain : “Honey”, tema de Bobby Russell e grande sucesso na voz de Bobby Goldsboro, em 1968 (gravado no Brasil por Moacir Franco como “Querida”, em versão de Fred Jorge). Outra faixa “da gravadora”. Arranjo sóbrio de cordas, cujo tema suerge pela flauta e depois repetido pelas cordas, entremeado por frases de uma viola caipira e emoldurada por harpas. No mesmo arranjo, entra “Summer Rain”, sucesso de 1967 (principalmente no Brasil) de Johnny Rivers.
Canção Para Inglês Ver : obra-prima do humor non-sense de Lamartine Babo (e tropicalista avant la lettre ). Composta em 1931, a música caiu como uma luva para a releitura tropicalista de Duprat e os Mutantes, em tempo de fox, como no estilo de época. Bizarra, humorística e absurda, é uma sátira à entrada de estrangeirismos com o suegimento do cinema falado e a forma peculiar do brasileiro em lidar com isso. Nada mais apropriado. É seguida por “Chiquita Bacana”, de 1949, clássica marchinha de João de Barro e Alberto Ribeiro, sucesso do Carnaval daquele ano, dessa vez ganha versão em ritmo de mambo.
Flying : obscura (e põe obscura nisso!) versão para um tema instrumental do filme Magical Mystery Tour (1967), dos Beatles. Aqui aparece o tema de clarinete de “Judy In Disguise”, procurando o tema principal, até cair na melodia tema, nas cordas. Não difere muito da versão original, inclusive usando o final “cagista” à sua maneira.
The Rain, The Park & Other Things : Duprat e Mutantes fazendo uma cover comme il fault deste gande sucesso (1967) de outra banda bubblegum pop , The Cowsills (uma espécie de Família Dó-Ré-Mi). Com direito a bucólicas harpas e sonoplastia de chuva idem.
Canto Chorado/Bom Tempo/Lapinha : Três temas da Bienal do Samba de 1968, da TV Record. “Canto Chorado” (Billy Blanco), bela toada que foi defendida por Jair Rodrigues, “Bom Tempo” (Chico Buarque) por Claudette Soares e “Lapinha” (Baden Powell e Paulo César Pinheiro) pela 'pimentinha' Elis Regina – que, aliás, levou o prêmio. Arranjo sóbrio, no melhor estilo das típicas orquestras de festival. Cuícas, agogôs, tamborins, pistom em surdina, num belo trabalho dos sopros.
Chega de Saudade : Tom Jobim e Vinícius de Moraes “in disguise”, transformados em um maxixe gafierado, o fim vira Jovem Guarda, com clarinetes e trombones a la “dixieland”.
Baby : a versão “dupratiana” para o clássico de Caetano e Gil, um misto do (esplêndido) arranjo para Gal Costa no Panis et Circenci s e o de Caetano no seu “álbum branco”.
Cinderella Rockefella: sucesso de 1968, escrito por Mason Williams e Nancy Ames, e gravado pelo casal Esther e Abi Ofarim, que se notabilizaram por cantarem no estilo espalhafatoso dos musicais dos anos 20 (“yodeling”), um típico “rag”. Os Mutantes fazem uma versão similar à original, porém mais original ainda. Incrível, não?
Ele Falava Nisso Todo Dia/Batmacumba/Frevo Rasgado : pout-pourri dedicado à Gilberto Gil, dois temas do segundo disco do autor de “ Geléia Geral”, que invocam a instrumentação do álbum Tropicália , mais “ Frevo Rasgado”, cujo arranjo é semelhante ao de Gil.
Lady Madonna : outra (deliciosa) versão obscura de “Lady Madonna”, sucesso dos Beatles (1968). Quem é fã dos Beatles (e principalmente dos Mutantes) vai gostar.
Quem Será : certamente a mais tropicalista de todas. Duprat pega um bolerão de Jair Amorim e Evaldo Gouveia (“Alguém me Disse”, “Alguém Como Tu”) e transforma em um mosaico: começa como uma valsa trágica ¾ com o ar soturno, sombrio e comovente das cordas e do trumpete, e depois, dentro do espírito do “chiste” dupratiano, vira uma marchinha com ar de banda de coreto, descambando para uma festa (com sons de platéia). Um resignado clarinetista tenta retomar o tema principal, e um gaiato diz: “péra”, ele tenta de novo, e o gaiato: “péra!”. Ele tenta de novo, e o gaiato diz: “mais uma, mas péra um pouco!”. Então ele recomeça com a banda e todos dizem: AEEEEEEEEEEEEEE”. Depois tudo termina numa grande gafieira, como não podia deixar de ser.
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quarta-feira, 28 de abril de 2010
O Anjo Torto do Rock
Gram Parsons
Gram Parsons foi um gauche na vida que partiu muito cedo — porém deixando uma indelével marca na história da música norte-americana moderna ao fundir o pop caipira do Bakersfield Sound (um oposto ao som conservador e sisudo de Nashville que nasceu com Buck Owens na Baixa California) com o rock'n roll, concebendo um híbrido que seria musicalmente um dos gêneros mais prolíficos a partir dos anos 70, o country-rock. é certo que, no começo dos anos 60, muitas bandas tentaram introduzir o hillibily e o bluegrass em sua sonoridade (como o Jim Kwensky e o Lovin' Spoonful, por exemplo) e os Byrds chegaram a elaborar um estilo diferenciado amalgamar o que se chamaria de folk-rock.
Contudo, foi somente a partir da colaboração quase que acidental de Parsons no quinteto de David Crosby e Roger McGinn que, junto com músicos como Clarence White e John Hartford, influenciados por gente como Merle Haggard que os Byrds iriam estragar a festa do country.
E, como não poderia deixar de ser, eles acabaram pagando um proço caro pela ousadia. Gram convenceu-os a gravar o hoje clássico Sweetheart Of The Rodeo em território inimigo — Nashville. Conseguiram uma apresentação no mítico Grand Ole Opry em 1968 que acabou sendo desastrosa: foram duramente vaiados e banidos da cena musical de lá.
O público não admitia que um bando de hippies cantasse a música deles e quebrasse o rígido e draconiano protocolo do conservadoríssimo e secular Opry. O tiro saiu pela culatra, pois nem os mais velhos aceitaram aquele novo som, e a maioria dos fãs dos Byrds não entenderam o disco. Foi um desastre, mas todos saíram ilesos. Menos Gram, que a despeito de ter influenciado a direção musical de Sweetheart Of The Rodeo, colaborando com a lírica Hickory Wind, foi expulso da banda durante uma turnê dos Byrds pela África do Sul, por se recusar a tocar para um público que ele considerava segregacionista.
Parsons não saiu chamuscado — não havia esquentado o banco no conjunto, já que era apenas um músico contratado por Chris Hillmann, que o indicou para McGinn. No ano seguinte, o próprio Chris, já um byrd demissionário, aproveitou a deixa para formar os Flying Burrito Brothers, que seria o primeiro grupo de country-rock por excelência.
A trajetória foi curta, porém assim como aconteceria com todo o trabalho de Gram, seria uma semente para o futuro. Revolucionário para aqueles tempos, Parsons só conseguiria uma relativa visibilidade para si e para seu engenho e arte depois de conhecer um outro maluco beleza, o guitarrista dos Rolling Stones, Keith Richards: depois de mudar o som dos Byrds, ele iria fazer o mesmo com o quinteto inglês. Isso aconteceria justamente no momento em que Keith estava desplugando o rock da banda em busca de algo mais próximo do country & western. Com efeito, o rumo que Jagger e companhia seguiriam nos álbuns dos stones entre 1969 e 1972 (do Let It Bleed ao Exile On Main Street) pagam tributo à Parsons. exemplos não faltam: Country Honk, Dead Flowers, Sweet Virginia, Let It Bleed, etc).
Gram aliás chegou a participar diretamente das sessões de gravação do exile em Nelicôte, em 71, mas sua personalidade instável e o abuso de drogas prejudicaram tanto a sua passagem pelos Burrito quanto pelos Stones. De volta do exílio na França, ele passaria algum tempo tocando com Ric Grech; de volta à América, ele conheceu Emmylou Harris, que estava se lançando como cantora. Era a parceria musical perfeita: a versão da dupla para Love Hurts (de Felice e Bordileaux Bryant, mesmos autores de All I Have To Do Is Dream) é certamente a mais bela irretocável de todos os tempos.
Com uma excelente banda de apoio (incluindo James Burton, guitarrista de estúdio de Elvis, cuja excelência pode ser comparada a de Luther Perkins), ele lançou uma carreira solo promissora, com contrato de gravadora (a Reprise). Promissora sim, se não fosse o endêmico problema de Parsons com as drogas, em especial a heroína. Contudo, o que o matou com apenas 26 anos foi uma mistura letal de álcool e morfina (como ocorrera com Hank Williams, um dos patriarcas do country, no começo dos anos 50). Lançado postumamente, em 1974, o inacabado Grievous Angel foi o seu segundo disco pela Reprise.
Na verdade, ele é um apanhado de sobras de gravações ao vivo (Hickory Wind e Cash On The Barrelhead) e esquetes do que seria o sucessor de GP, de 1972.
Mesmo díspar por natureza, Grievous resume bem a música que Gram Parsons sempre buscou naquilo que ele paradigmaticamente concebia como 'Cosmic American Music', um country meio biruta que mistura o rural e urbano, o temporal e o atemporal, em suma, um country futurista e universalista, acima de rotulações beligerantes (algo que então era comum no ambiente musical conflagrado do gênero) e reducionistas. Nem a morte de Gram salvaria as pretensões do disco, que passou desapercebido na época — nem configurou nos charts. Só o tempo cuidaria de restituir à Parsons e ao subestimado Grievous Angel o devido lugar no panteão do rock.
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terça-feira, 27 de abril de 2010
A Fantástica Fábrica do Creedence
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Como poucos do gênero, o Creedence Clearwater Revival pegou a fórmula simples de recriar velhos clássicos do R&B e do rock tradicional na rascante vez de John Fogerty e emoldurado com um instrumental eficiente dele — com sua Rickembaker Capri — e Tom, seu irmão, Stu Cook, (no baixo) e Doug Clifford (na bateria), rendeu sete discos interessantíssimos (embora muitos erroneamente, e põe erroneamente nisso, os considerem uma banda de duas coletâneas, embora isso se explique pelo fato que o CCR era uma eficiente banda de singles).
Difícil destacar qual seria o melhor, porém o mais significativo, quando o grupo estava em seu auge (cinco discos em dois anos e três compactos entre os cinco mais vendidos) e, naturalmente, no topo de sua popularidade em Cosmo’s Factory.
O álbum flagra o momento em que o CCR, mesmo repetindo a esse puída e vetusta fórmula, obtém a excelência de passar a limpo o próprio som de forma enxuta. O título se explica: Doug, que era interessado em astronomia, havia ganho o apelido e, por ser um trabalhador incansável na banda, virou o capitão de indústria da maior fábrica de sucessos dos anos 60.
Só Cosmo’s tem, entre tantos covers e originais, I Heard It Trough The Grapevine, Up Around The Bend, As Long I Can See The Light, uma das suas mais belas criações, como lado B de Travelin’ Band, que lembra de perto o Little Richard dos tempos da Vee-Jay. Também clássicos de Bo Diddley (Before You Accuse Me), Arthur Crudup (My Baby Left Me, que é parecida com That’s Allright Mama por que são ambas do mesmo autor) e Roy Orbison das antigas (Ooby Dooby), um libelo contra a Guerra do Vietnã (Run Trough the Jungle, tema recorrente nas letras de Fogerty, aliás, como em Fortunate Son e Who’ll Stop The Rain com a frase “cinco anos de planos e novos acordos presos em correntes douradas) e crítica social em Rumble Tumble (“policiais nas ruas, lixo na calçada e atores na Casa Branca”).
Mas como infelizmente tudo o que sobe tem que descer, Cosmo’s Factory também marca o começo do fim, quando John Fogerty, à medida em que amplia o seu trabalho de estúdio como arranjador e multi-instrumentista e de produção, começa a dominar os negócios da banda, gerando constantes tensões entre ele e os demais integrantes, mas principalmente entre ele e Tom, que ameaçava sair do CCR o tempo todo.
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segunda-feira, 26 de abril de 2010
O Pierre Boulez do rock
Capa
Gênio incompreendido até hoje, Frank Zappa é o Pierre Boulez do rock. Não. Melhor. Ele é o Igor Stravinsky do rock, com toda a certeza.
Ninguém foi capaz de misturar rhythm and blues, música erudita de vanguarda, música aleatória e free jazz com aquele conhecido gênero entronizado por Elvis Presley como ele. Freak Out! (1966), seu dèbut sonoro já era um pé no traseiro do bom mocismo musical-cultural sessentista (que se limitava talvez no máximo a aceitar que os Beatles pegassem na sua mão) com suas vinhetas malucas, seus duelos entre tonalismo e atonalismo, sua sonoridade sofisticada e crua, sua metalingüística sonora, seu extremo lavor de joalheiro em trabalhar faixas editando rolos com material ao vivo e de estúdio, orquestra de cordas e sopros, reelaboração de conceitos wagnerianos como o leitmotiv em seus discos (que ele particularmente chamava de “continuidade conceitual”), tudo ligeiramente invulgar para um artista que, via de regra, estava “apenas pelo dinheiro”.
Pois esse era o seu dilema: toda a piração fonográfica de Zappa comercialmente redundava em (quase) nada. Naquele momento histórico, o Mothers of Invention estava pagando um preço caro pelas suas crudelíssimas invencionices.
Ninguém via a cor do dinheiro. Mal comparando, era mais fácil convencer um fã dos Monkees a ouvir a Sagração da Primavera do que emplacar um disco seu nas paradas de sucesso. Insatisfeito com o estado das coisas, Frank dissolveu os Mothers e resolveu re-incursionar em novo trabalho solo (o primeiro fora Lumpy Gravy, de 1968).
Hot Rats é, basicamente, um projeto seu com Ian Underwood, o seu insígne factorum. O paradoxal é que, dada a situação delicada de ser um músico hermético e difícil para os ouvidos moucos das grandes massas, a lógica seria cair em fórmulas fáceis. Não foi o caso de Zappa.
Cercado de músicos de escol — da estirpe de Jean Luc Ponty, Shuggie Otis (outro gênio incompreendido até por ele mesmo), Max Bennett, Capitain Beefheart (nada mais natural, já que eram duas almas gêmeas e que já haviam trabalhado juntos antes dos Mothers) e Don Harris, entre outros, com o perdão da frase feita, Frank fechou a década com chave de ouro.
Arrojado e revolucionário, Hot Rats é um dos melhores discos de rock (?) instrumental de todos os tempos. A excelência do álbum passa por dois níveis: o primeiro, a construção milimétrica dos arranjos de cada faixa e a escolha dos timbres e cores tonais.
O segundo, o conhecimento enciclopédico de Zappa em dominar as mais insuspeitas técnicas de estúdio (aliando-se à isso o fato dele possuir à sua inteira disposição uma mesa de dezesseis canais, coisa que, na época, só o supracitado quarteto de Liverpool podia ter, e olhe lá) a seu favor — fruto de seus trabalhos anteriores. Isso sem contar com a engenharia de som e a tecnologia que ele tinha em suas mãos naquele momento. Um exemplo disso são as alterações rítmicas que ele faz em faixas como It Must Be a Camel (coloque no topo da sua lista do Last.fm!), onde Frank, que no começo da carreira foi baterista, usa e abusa de overdubs (técnica que consiste em mixar e sobrepor novos solos em cima de fitas já gravadas) tanto na percussão quanto em linhas de contrabaixo e metais.
Caótico? Nem um pouco. É por conta disso que nada ali é supérfluo: Na atmosfera de Hot Rats, tudo se complementa e ainda surrealisticamente emoldura as brilhantes cadências de Underwood, que cria memoráveis seções geniais de sopros, enquanto o subestimado guitarrista Zappa faz sua Gibson gemer como nunca (como em Willie The Pimp, que conata com a participação de Beefheart no único vocal do disco). Nem Stravisnky faria melhor.
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domingo, 25 de abril de 2010
Will the Circle Be Unbroken
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O Country nasceu do Hillibily, um gênero que floresceu no sul dos Estados Unidos e na região dos Apalaches, e tinha raízes folclóricas.
Apesar das primeiras gravações surgirem só nos anos 20, ele só se tornou popular na era do rádio, principalmente com o advento do maior programa radiofônico do estilo, Grande Ole Opry, líder de audiência transmitido pela WSM-AM de Nashville desde 1925 até os dias de hoje, e foi responsável pela mitificação de grandes nomes do country, principalmente os pioneiros, como Jimmie Rodgers, Roy Acuff, a Família Carter e, é claro, o maior de todos, Hank Williams.
Com a aparição do rock e o rockabilly (que era um country misturado com boogie woogie e mais percussão, algo que o country abominava), o gênero perdeu o seu público jovem e, em Nashville, gente como Owen Bradley e Chet Atkins, junto com a Columbia e a Victor, decidiram investir maioridade ao estilo, deixando o country mais classudo e menos "caipirizado", com a escolha de cantores de qualidade (como Don Gibson e Jim Reeves, por exemplo) e aranjos idem — era o Nashville Sound.
Esse estilo teve o seu auge no fim dos anos 50 e começo, e começou a decair quando começou a se regionalizar e perder cada vez mais espaço para o rock ianque que, a partir dos anos 60, passou a capitalizar muitos de seus elementos.
Um exemplo é Elvis Presley, que tinha os Jordinaires como backing group, o mesmo que acompanhava a rainha do country, Patsy Cline, e utilizou muitos elementos do Nashville Sound em sua música. A partir do fim dos anos 60, o rock deglutiu o country: bandas como o Grateful Dead, os Allman Brothers, os Byrds, Flying Burrito Brothers criaram o country-rock, à medida outros músicos, como Willie Nelson, Dolly Parton, Loretta Lynn, Linda Ronstadt, Gram Parsons, Clarence White e Emmilou Harris, que popularizavam o country fora do cânone de Nashville, num sub-gênero intitulado outlaw country.
Nessa época, na Califórnia, na esteira do Dead e dos Byrds, surgiu o The Nitty Gritty Dirt Band. Inicialmente uma jugband (espécie de ensamble de folk e bluegrass mais “roots”, com instrumentos rústicos, misturando violões e mandolins com reco-recos de tábuas de lavar roupa e contrabaixos feitos de baldes e vassouras, vasos de barro como instrumentos de sopro, dando um certo ar humorístico à apresentação desses conjuntos), eles seguiram o caminho da banda de Roger McGuinn no disco Sweetheart Of The Rodeo no sentido de empreender uma pesquisa histórica das raízes do country.
Contudo, ao contrário daqueles, a Nitty Gritty Dirt Band decidiu dar cabo desse desafio: além de tentar contar a história do gênero mais popular da América, eles resolveram juntar o pessoal da antiga com a nova geração, no disco Will the Circle Be Unbroken. Concebido como álbum triplo, ele pode ser comparado em magnitude ao Anthology of American Folk Music.
A diferença é que, em vez de ser uma mera compilação, a Nitty Gritty juntou toda aquele pessoal que estava esquecido pelo tempo e os convidou para uma sessão histórica. Reuniram dinossauros do country, como Roy Acuff, Doc Watson, Earl Scruggs (que é um, senão o maior tocador de banjo da história do bluegrass americano), Vassar Clement, Jimmy Martin e a matricarca do gênero e exímila violonista, Maybelle Carter, a histórica remanescente da primeira dentição da Família Carter que, naquela época, ainda aparecia no programa de Johnny Cash (Mãe Maybelle era a sogrona de Cash, que era casado com June e irmã de Helen).
O improvisado (as sessões foram gravadas ao vivo, em tomadas únicas e praticamente sem mixagens posteriores) encontro dos cabeludos da Costa Oeste americana do Nitty Gritty Dirt Band coma Velha Guarda do country foi um sucesso. A regravação do clássico de Hank Williams, I Saw The Light chegou às paradas, Will the Circle Be Unbroken concorreu ao Grammy de disco do ano, o veterano Clement se tornou celebridade depois de anos de quase anonimato e Nitty Gritty foi convidado para realizar uma turnê pelo Extremo Oriente.
Além de I Saw The Light, Will the Circle Be Unbroken revisita décadas de country, indo de canções “contemporâneas” como Both Sides Now (de Joni Mitchell), interpretado por Randy Scruggs, e passando por clássicos de Hank Williams, como Honky Tonk Blues, a lenda do fingerpiking, Merle Travis, com a sua Dark as Dungeon (que foi regravado por Johnny Cash no At The Folsom Prision), cantado por próprio autor, Orange Blossom Special, Keep On The Sunny Side, Lost Highway, I Am a Piligrim (também gravado pelos Byrds) e, como não poderia deixar de ser, o maior sucesso da Família Carter, Wildwood Flower, cantado pela Mãe Maybelle. Em 1989, Will the Circle Be Unbroken ganharia uma continuação.
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Nitty Gritty
sábado, 17 de abril de 2010
Bob Dylan na Encruzilhada
O single original
Só para quem pense que esse humilde e missérimo blog não é apenas de resenhas de álbuns (a aproveitando o mote do tópico abaixo), aqui vai uma sugestão de livro: Like a Rolling Stone – Bob Dylan na Encruzilhada, de Greil Marcus (Companhia das Letras; tradução de Celso Mauro Paciornik; 256 páginas; 42 reais). Não existe nada mais comentado e incensado do que o legado do compositor norte-americano na história da música, mas é interessante ver o quanto a importância dessa canção, lançada em Julho de 1965, se tornou emblemática.
Douas questões: a indústria musical ianque, até o começo daquela década, ainda carregava o atavismo originário do tempo do teatro de revista, mais precisamente do chamado beco dos compositores, o Tim Pan Alley. O tal beco, a West 28th Street, entre a Quinta e a Sexta avenidas, originalmente um sítio destinado a abrigar casa fonográficas e de venda de partituras, se transformaria, nas décadas seguintes, numa indústria de compositores associados, cujo papel era, justamente, fazer canções sob encomenda.
Com o tempo, já nos tempos do disco, dividiu-se o papel do intérprete e o do compositor. Isso foi vital naquele momento histórico; contudo, ocorreu um problema quase incontornável: cantores eram tolhidos a criarem as suas próprias músicas. O empresário/produtor já tinha a música prontinha para fazer sucesso.
Isso acabou atingindo o rock. Na maioria das vezes, astros do gênero, como Elvis Presley, tinham que gravar o que o dono da gravadora mandava. Em alguns casos, como no da dupla Jerry Leiber-Mike Stoller, a idéia dava certo, porque o resultado eram canções que eram a cara do Rei, e eram músicas que combinavam com o seu estilo. Mas, em outros, era um desastre: você ficava totalmente cativo dessa relação quase mafiosa, e era obrigado a cantar o que não queria.
No caso específico de Bob Dylan, em seu primeiro disco, de 1962, ele gravou quase apenas covers. Em seu segundo, The Freewheelin' Bob Dylan, ele não só passou a registrar o seu material, quanto começou a fornecer temas para outros intérpretes. O mesmo acontecia com os Beatles. Muito à contragosto de seu produtor, eles investiram em seus números. A coisa deu certo, e certo até demais.
A eletrificação de sua música começou depois que ele deixou a temática de protesto, em Another Side. Depois, em 1965, fez a inefável experiência de gravar Bringing All Back Home elétrica de um lado e acústica o outro.
Ali, já era possível perceber que a temática era um misto de alegoria, ilusionismo circense, ao mostrar contradições na sociedade consumista moderna numa linguagem surreal jamais antes vista em sua lírica. Já era possível mostrar cruzamentos de literatura Beat, visões poetizadas da arte de Warhol e Dali e a torrencialidade de Chuck Berry numa linguagem de blues. O paroxismo foi quando ele pegou gente como Mike Bloomfield (Paul Butterfield Band) e Al Kooper para gravar o Highway 61 Revisited. Like a Rolling Stone era um cavalo de tróia: "Aquilo era lindo, ele não parava de cantar", disse Paul McCartney.
Ou seja, algo de diferente estava acontecendo. Era como se, de repente, mesmo que sequer existisse crítica musical de rock naquelas priscas eras, a rigor havia vida inteligente no gênero. Como se não bastasse a coincidência que envolveu Beatles e Dylan, a coisa para ambos os lados estava porestes a explodir lá pelos lados da Tim Pam Alley: intérpretes agora compunham o seu material, e para piorar, tinham muito a dizer. Se Dylan não possa vir a ser o precursor, ele foi, com efeito, um dos que ajudou a consolidar esse paradigma.
Foi isso que permitiu que, imediatamente, surgisse uma pequena grande geração de bandas de rock que soube mudar a cara do rock, plenamente estandartizado e apolitizado. Aí apareceria gente como Arthur Lee, Arlo Guthrie, Jimi Hendrix, e todos os outros. Era uma revolução estética dentro do gênero, e que também possibilitaria que surgissem excrescências interessantes, comoo rock conceitual, por exemplo.
Outro fator preponderante é o fato de que, da mesma forma com a qual a produção dos discos era totalmente pré-concebida, agora tudo poderia acontecer, tanto na concepção de um álbum quando em sua divulgação. Dylan, e depois uma legião bíbilica, iria extrapolar o cabresto dos programas de rádio, que iriam dar mais espaço para o rock — e para além da mordaça dos famosos três minutos. Querer forçar um artista a expressar sua música em três minutos parece tarefa de dinâmica de grupo. Agora, os DJ's e os donos de emissoras teriam que se curvar a eles, porque, da mesma forma com que o paradigma do rock estava mudando, o público também estava.
O curioso é que, no âmbido pessoal, Dylan estava de saco cheio do show-biz e estava a um passo de dar de ombros e largar tudo. Naquela fase, ele estav se tornando uma pessoa transtornada como assédio dos jornalistas, em coletivas absurdas, fora a briga que ele se meteu com o público na controversa apresentação em Newport. Mesmo que tentasse dissimular, o autor de Mr. Tambourine Man se enfastiou da forma como boa parte da comunidade folk, que hava se tornado porta-voz dos Direitos Civis e o adotara como menino-prodígio, em nome da verdade, havia se tornado conservadora e arrogante.
Foi naturalmente chamado de traidor, começoua tocar alto nos shows com uma banda elétrica par o desespero dos fãs. Aquilo ia desenvolvendo uma postura engraçdamente corrosiva, sarcástica e agressiva. Basta vê-lo uivando Like a Rolling Stone no documentário Eat The Document. Era o tragicômico embate do herói solitário e incompreendido contra a ira do público.
Mas a letra tinha algo de misterioso em alguém que despreza uma garota para um mundo subterrâneo, ao mesmo tempo em que expressa uma estranha compaixão por ela e pela perda da inocência de alguém. Ela tinha tudo, agora não tem nada, está em seu próprio mundo, então agora ela é livre.
Porém, ao mesmo tempo em que comparar as duas situações, a glória e a queda, de forma cáustica, num rancor transformado num divertido sadismo, como se olhasse nos olhos da garota perguntando como ela se sente, e agora? Um repórter lhe perguntou sobre a moral da história: "você quer fazer a cabeça deles, mudar a vida deles, ou apenas mostrar-lhes o quanto estavam errados?". "Não, eu só quero é alfinetá-los", respondeu Dylan, rindo como um sátiro.
Muitos se perguntavam a quem ele queria alfinetar. Citar de Joan Baez à modelo Edie Sedgwick. Um biógrafo, Howard Sounes, entende que muitas outras canções foram endereçadas e ex-namoradas (Sedgwick em Leopard-Skin Pill-Box Hat, por exemplo) mas, para ele, Like a Rolling Stone é rigorosamente arquétpica: "é mais possível afirmar que ela é sobre todas aquelas pessoas que ele considerava falsas e dissimuladas", diz.
E para não dizer que eu não postei nenhum disco, aqui vai um bootleg interessante, apenas com outtakes de Like a Rolling Stone e do álbum Highway 61 Revisited:
Rolling Stone Sessions
Disc 1 Columbia Recording studio 16-6-1965
1. Like A Rolling Stone (take 1)
2. Like A Rolling Stone (take 2)
3. Like A Rolling Stone (take 4)
4. Like A Rolling Stone (take 6)
5. Like A Rolling Stone (take 7)
6. Like A Rolling Stone (take 8)
7. Like A Rolling Stone (take 10)
8. Like A Rolling Stone (take 15)
9. Why Should You Have To Be So Frantic?
Disc 2 Columbia recording studios 15-6-1965
1. It Takes A Lot To Laugh, It Takes A Train To Cry (featured in No Direction Home movie)
2. It Takes A Lot To Laugh, It Takes A Train To Cry (9 - from No Direction Home Soundtrack)
3. Sitting On A Barbed-Wire Fence (12 - from Highway 61 Revisited Again)
4. It Takes A Lot To Laugh, It Takes A Train To Cry (13 - from The Bootleg Series Vol. 2)
5. Sitting On A Barbed-Wire Fence (16 - from The Bootleg Series Vol. 2)
6. Like A Rolling Stone (17 - from Highway 61 interactive cd-rom)
7. Like A Rolling Stone (18 , 19 or 20 - from Bootleg Series Vol. 2)
8. Like A Rolling Stone (21 - from Highway 61 interactive cd-rom)
9. It Takes A Lot To Laugh, It Takes A Train To Cry (take 13 - alternate source - mono, with intro and real ending)
10. Sitting On A Barbed-Wire Fence (take 16 - alternate source - mono with count in)
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Sounds Of Silence
A Capa
A história de Sounds Of Silence é cheia de idas e vindas: muita gente não sabe, mas a dupla nova-iorquina Simon And Garfunkel tiveram uma carreira de duas fases, nos anos 60. O primeiro capítulo se deu quando os executivos da Columbia se interessaram pelo som deles, ao ouvi-los nos bares do Village.
Na época, a cena folk grassava, ainda mais naquela região da cidade a sua música, um misto da delicadeza vocal dos Everly Brothers com o espírito sisudo de protesto do Kingston Trio, com covers de canções tradicionais e letras ligeiramente sofisticadas foiparar em disco, o Wednesday Morning, 3 A.M.
Lançado no Inverno de 1964, como se disse, pelo fato de ser uma dupla mais conhecida na cena de Nova Iorque (ou seja, desconhecida) e de um blend refinado, tudo somado a um disco que não teve um appeal radiofônico e/ou divulgação merecida, afundou nas paradas. Resultado: Paul e Art passaram despercebidos.
O disco não vendeu e eles se separaram. Simon foi tocar na Inglaterra e tentar uma carreira-solo. É aquele tipo de coisa: quando menos se espera, é aí que elas podem vir a acontecer. Sem um mínimo de payola (o jabá deles), eis que alguns disc-jockeys começaram a receber pedidos insistentes de Sounds Of Silence.
A despeito de ter sido lançada no Wednesday Morning, 3 A.M., era óbvio que a canção tinha enorme potencial, mas a CBS cochilou e perdeu a chance de catapultar o álbum com ela. Contudo, os pedidos de ouvintes chegaram aos ouvidos do produtor do disco, Tom Wilson que, naquela época, trabalhava com Dylan. Naquele momento, o folk meio que se vooltava para o folk-rock, e ele, a revelia da dupla, decidiu retrabalhar a música.
Pegou uma banda de estúdio e, à maneira do som dos Byrds — na tendência de se eletrificar o folk (algo que não passava pela cabeça dos dois, naturalmente), que começava a fazer sucesso nas rádios, foi uma surpreendente remixagem de Sounds Of Silence, ponto os músicos a sutilmente tocar 'em cima' da versão original. Ele transformou a nova versão em single e pôs no mercado. A canção, composta em 63, era um triste e pessimista desabafo ante o estado de comoção pelo assassinato do presidente Kennedy, em Novembro do ano anterior.
qual não foi a surpresa do jovem Simon quando viu sua música esquecida chegar ao topo da Billboard no começo de 1966. Não pensou duas vezes: pegou o primeiro avião para Nova Iorque e, com novamente Art ao seu lado, gravou um punhado de canções para fechar um álbum — Sounds Of Silence. A repentina visibilidade foi o caminho para que, junto com essa voga, eles pudessem amalgamar o disco com o seu material tradicional, acústico.
A mistura foi o suficiente tanto para que eles se tornassem a coqueluche do Inverno daquele ano, quando para que o subestimado Wednesday Morning, 3 A.M. voltasse às prateleiras das lojas. O disco, inteligente e emocionante da primeira a última faixa, possui canções inesquecíveis como Blessed, Anji (um instrumental que lembra Kisses Sweeter Than Wine) Leaves That Are Green, a linda Kathy's Song e — é claro, a lindíssima April Come She will, onde Paul mostra todo o seu virtuosismo como solista. O disco fecha com a rancorosa I Am a Rock. Um clássico.
Links nos comentários (agradecimentos ao George Gramophone! Valeu, cara)
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