sábado, 17 de abril de 2010
Bob Dylan na Encruzilhada
O single original
Só para quem pense que esse humilde e missérimo blog não é apenas de resenhas de álbuns (a aproveitando o mote do tópico abaixo), aqui vai uma sugestão de livro: Like a Rolling Stone – Bob Dylan na Encruzilhada, de Greil Marcus (Companhia das Letras; tradução de Celso Mauro Paciornik; 256 páginas; 42 reais). Não existe nada mais comentado e incensado do que o legado do compositor norte-americano na história da música, mas é interessante ver o quanto a importância dessa canção, lançada em Julho de 1965, se tornou emblemática.
Douas questões: a indústria musical ianque, até o começo daquela década, ainda carregava o atavismo originário do tempo do teatro de revista, mais precisamente do chamado beco dos compositores, o Tim Pan Alley. O tal beco, a West 28th Street, entre a Quinta e a Sexta avenidas, originalmente um sítio destinado a abrigar casa fonográficas e de venda de partituras, se transformaria, nas décadas seguintes, numa indústria de compositores associados, cujo papel era, justamente, fazer canções sob encomenda.
Com o tempo, já nos tempos do disco, dividiu-se o papel do intérprete e o do compositor. Isso foi vital naquele momento histórico; contudo, ocorreu um problema quase incontornável: cantores eram tolhidos a criarem as suas próprias músicas. O empresário/produtor já tinha a música prontinha para fazer sucesso.
Isso acabou atingindo o rock. Na maioria das vezes, astros do gênero, como Elvis Presley, tinham que gravar o que o dono da gravadora mandava. Em alguns casos, como no da dupla Jerry Leiber-Mike Stoller, a idéia dava certo, porque o resultado eram canções que eram a cara do Rei, e eram músicas que combinavam com o seu estilo. Mas, em outros, era um desastre: você ficava totalmente cativo dessa relação quase mafiosa, e era obrigado a cantar o que não queria.
No caso específico de Bob Dylan, em seu primeiro disco, de 1962, ele gravou quase apenas covers. Em seu segundo, The Freewheelin' Bob Dylan, ele não só passou a registrar o seu material, quanto começou a fornecer temas para outros intérpretes. O mesmo acontecia com os Beatles. Muito à contragosto de seu produtor, eles investiram em seus números. A coisa deu certo, e certo até demais.
A eletrificação de sua música começou depois que ele deixou a temática de protesto, em Another Side. Depois, em 1965, fez a inefável experiência de gravar Bringing All Back Home elétrica de um lado e acústica o outro.
Ali, já era possível perceber que a temática era um misto de alegoria, ilusionismo circense, ao mostrar contradições na sociedade consumista moderna numa linguagem surreal jamais antes vista em sua lírica. Já era possível mostrar cruzamentos de literatura Beat, visões poetizadas da arte de Warhol e Dali e a torrencialidade de Chuck Berry numa linguagem de blues. O paroxismo foi quando ele pegou gente como Mike Bloomfield (Paul Butterfield Band) e Al Kooper para gravar o Highway 61 Revisited. Like a Rolling Stone era um cavalo de tróia: "Aquilo era lindo, ele não parava de cantar", disse Paul McCartney.
Ou seja, algo de diferente estava acontecendo. Era como se, de repente, mesmo que sequer existisse crítica musical de rock naquelas priscas eras, a rigor havia vida inteligente no gênero. Como se não bastasse a coincidência que envolveu Beatles e Dylan, a coisa para ambos os lados estava porestes a explodir lá pelos lados da Tim Pam Alley: intérpretes agora compunham o seu material, e para piorar, tinham muito a dizer. Se Dylan não possa vir a ser o precursor, ele foi, com efeito, um dos que ajudou a consolidar esse paradigma.
Foi isso que permitiu que, imediatamente, surgisse uma pequena grande geração de bandas de rock que soube mudar a cara do rock, plenamente estandartizado e apolitizado. Aí apareceria gente como Arthur Lee, Arlo Guthrie, Jimi Hendrix, e todos os outros. Era uma revolução estética dentro do gênero, e que também possibilitaria que surgissem excrescências interessantes, comoo rock conceitual, por exemplo.
Outro fator preponderante é o fato de que, da mesma forma com a qual a produção dos discos era totalmente pré-concebida, agora tudo poderia acontecer, tanto na concepção de um álbum quando em sua divulgação. Dylan, e depois uma legião bíbilica, iria extrapolar o cabresto dos programas de rádio, que iriam dar mais espaço para o rock — e para além da mordaça dos famosos três minutos. Querer forçar um artista a expressar sua música em três minutos parece tarefa de dinâmica de grupo. Agora, os DJ's e os donos de emissoras teriam que se curvar a eles, porque, da mesma forma com que o paradigma do rock estava mudando, o público também estava.
O curioso é que, no âmbido pessoal, Dylan estava de saco cheio do show-biz e estava a um passo de dar de ombros e largar tudo. Naquela fase, ele estav se tornando uma pessoa transtornada como assédio dos jornalistas, em coletivas absurdas, fora a briga que ele se meteu com o público na controversa apresentação em Newport. Mesmo que tentasse dissimular, o autor de Mr. Tambourine Man se enfastiou da forma como boa parte da comunidade folk, que hava se tornado porta-voz dos Direitos Civis e o adotara como menino-prodígio, em nome da verdade, havia se tornado conservadora e arrogante.
Foi naturalmente chamado de traidor, começoua tocar alto nos shows com uma banda elétrica par o desespero dos fãs. Aquilo ia desenvolvendo uma postura engraçdamente corrosiva, sarcástica e agressiva. Basta vê-lo uivando Like a Rolling Stone no documentário Eat The Document. Era o tragicômico embate do herói solitário e incompreendido contra a ira do público.
Mas a letra tinha algo de misterioso em alguém que despreza uma garota para um mundo subterrâneo, ao mesmo tempo em que expressa uma estranha compaixão por ela e pela perda da inocência de alguém. Ela tinha tudo, agora não tem nada, está em seu próprio mundo, então agora ela é livre.
Porém, ao mesmo tempo em que comparar as duas situações, a glória e a queda, de forma cáustica, num rancor transformado num divertido sadismo, como se olhasse nos olhos da garota perguntando como ela se sente, e agora? Um repórter lhe perguntou sobre a moral da história: "você quer fazer a cabeça deles, mudar a vida deles, ou apenas mostrar-lhes o quanto estavam errados?". "Não, eu só quero é alfinetá-los", respondeu Dylan, rindo como um sátiro.
Muitos se perguntavam a quem ele queria alfinetar. Citar de Joan Baez à modelo Edie Sedgwick. Um biógrafo, Howard Sounes, entende que muitas outras canções foram endereçadas e ex-namoradas (Sedgwick em Leopard-Skin Pill-Box Hat, por exemplo) mas, para ele, Like a Rolling Stone é rigorosamente arquétpica: "é mais possível afirmar que ela é sobre todas aquelas pessoas que ele considerava falsas e dissimuladas", diz.
E para não dizer que eu não postei nenhum disco, aqui vai um bootleg interessante, apenas com outtakes de Like a Rolling Stone e do álbum Highway 61 Revisited:
Rolling Stone Sessions
Disc 1 Columbia Recording studio 16-6-1965
1. Like A Rolling Stone (take 1)
2. Like A Rolling Stone (take 2)
3. Like A Rolling Stone (take 4)
4. Like A Rolling Stone (take 6)
5. Like A Rolling Stone (take 7)
6. Like A Rolling Stone (take 8)
7. Like A Rolling Stone (take 10)
8. Like A Rolling Stone (take 15)
9. Why Should You Have To Be So Frantic?
Disc 2 Columbia recording studios 15-6-1965
1. It Takes A Lot To Laugh, It Takes A Train To Cry (featured in No Direction Home movie)
2. It Takes A Lot To Laugh, It Takes A Train To Cry (9 - from No Direction Home Soundtrack)
3. Sitting On A Barbed-Wire Fence (12 - from Highway 61 Revisited Again)
4. It Takes A Lot To Laugh, It Takes A Train To Cry (13 - from The Bootleg Series Vol. 2)
5. Sitting On A Barbed-Wire Fence (16 - from The Bootleg Series Vol. 2)
6. Like A Rolling Stone (17 - from Highway 61 interactive cd-rom)
7. Like A Rolling Stone (18 , 19 or 20 - from Bootleg Series Vol. 2)
8. Like A Rolling Stone (21 - from Highway 61 interactive cd-rom)
9. It Takes A Lot To Laugh, It Takes A Train To Cry (take 13 - alternate source - mono, with intro and real ending)
10. Sitting On A Barbed-Wire Fence (take 16 - alternate source - mono with count in)
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