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terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Dig Out Your Soul


A capa




O incensado livro 1001 Albuns You Must Hear Before You Die recebeu recentemente uma nova edição. Lançada em 2005, a obra foi atualizada nas edições posteriores e, na de 2009, a lista ganhou 25 novos discos; na mesma medida, o mesmo número de álbuns foi defenestrado.

O que fica é que, vendo pela listagem recente, é difícil entender o que seja canônica em matéria de música numa época em que o próprio formato entrou em franca decadência e, ao mesmo tempo, sabemos que não existe a distância que o tempo requer para que possamos reverenciar alguma criação singular.

Ou seja, qualquer acréscimo posterior pode se configurar de ordem duvidosa. Por exemplo: em 1967, o disco Forever Changes estava longde de adquirir o sucesso que ele obteve ao longo dos últimos 40 anos, o colocando necessariamente no cânone do rock.

Portanto, ao vermos discos incluídos recentemente, não sabemos onde começa o juízo dos críticos e termina o ufanismo de ocasião, ou onde a análise especializada não termine, com efeito, desembarcando em mero cabotinismo.

Mesmo assim, independente de quaisquer critérios que levaram o coletivo de críticos e jornalistas que outrora formaram uma lista de 1001 discos agora coloca 25 a mais para tirar outros tantos, excluindo pois trabalhos que haviam sido canonizados como "para ouvir antes de morrer" (ou "de dormir", como diria o Sultão Schariar).

Já que é permitido mexer na lista dos 1001, eu incluiria um disco que deve configurar na atualização - o Dig Out Your Soul, do Oasis. Lançado em 2008, é o "canto do cisne" da banda e, desde então, uma obra-prima dentro da discografia do grupo britânico. Senão, vejamos.

Entre 1994 e 1998, o Oasis viveu a sua fase de ouro, que coincidiu com o movimento do Britpop, enfeixando discos de sucesso. Em 2001, o conjunto quebrou a sequência num disco experimentalísimo e descontínuo, o Standing on The Shoulders Of Giants.

No começo da nova centúria, a banda de Noel Gallagher acabou se transformando numa cópia pouco inspirada de si. Álbuns como Heathen Chemistry (2002) e Don't Believe the Truth (2005), o Oasis se perdeu em digressões pouco inspiradas.

O que os discos têm em comum, além da emergência das composições de Gem Archer e Liam, é em parte um autopastiche nas canções de sucesso e músicas fraquíssimas, transformando os discos em retalhos musicais.

Quem ainda segurava o estro era, como sempre, o próprio Noel - porém, caprichando nos lados B. Aliás, nessa fase, o melhor da produção reside nessa material alternativo do quinteto inglês.

(Meus leitores, se é que os tenho, irão apartar-me citando o What's the Story Morning Glory. Porém, permitam que vocês discordem um pouco de vocês e concordem um pouco comigo dessa vez)

O Oasis acabou em 2010. Também, pudera: um ano antes, havia lançado o seu melhor disco, Dig Out Your Soul. Quando se esperava apenas uma continuação dos discos anteriores, este CD se mostrou, a despeito de usar sempre a intertextualidade em suas canções - cuja referência sempre é o pop inglês dos anos 60, uma extrema originalidade em sua concepção.

Se formos ver em retrospectiva, os material dos discos lançados entre o Be Here Now até o Dig Out, com exceção do Standing... mais pareciam meros sacos de gatos, onde víamos algumas tentativas musicais de Liam e muito do típico material Lado B de Noel, incluindo muitas canções acústicas, sem grande acabamento formal. Ao mesmo tempo, a cada lançamento, era aquele papo do “o novo disco do Oasis é à volta às raízes”, só que essas raízes não se ligavam a nada parecido com a sonoridade crua do Definitively Maybe.

Até que, na concepção do Dig Out Your Soul, Liam disse em entrevista exatamente o que listamos aqui: os discos anteriores pecavam por falta de unidade, e muitas das canções acústicas mais pareciam pré-produções, como Le There Be Love ou Songbird. Ou seja, houve um diferencial em sua concepção: fazer um álbum totalmente elétrico. Tanto pela capa quanto pelos arranjos, é difícil não compará-lo ao Be Here Now: disco com forte matiz psicodélica e canções plenas de ruído, distorção e muito raga music. O que o diferencia do disco de 1997 é justamente a concisão: as faixas são relativamente curtas e “objetivas”, com clássicos instantâneos sem a intenção do pastiche, como víamos em Layla ou Go Let it Out.

A sequência de The Turning até Falling Down é perfeita, até que o Oasis levanta voo em viagens mais corrosivamente psicodélicas, como The Nature of The Reality. Ao mesmo tempo, eles pagam o seu devido tributo ao rock dos anos 60, em sua vertente lisérgica, ao mesmo tempo em que retornam às raízes, como que passando a limpo o som de garagem que originou o Oasis – sem no entanto ser um verdadeiro retorno, porquanto o Definitively Maybe guarda ainda a pátina do rock de garagem com músicos que, com efeito, não estão mais na banda.

Ou, para entendermos melhor. O retorno será sempre supressivo, terá o corte da visão da experiência de quase vinte anos de produção musical. O retorno, pois, é figurado, mas guarda certa aura de autenticidade no fato de que, em seu canto de cisne, o Oasis realmente quis empreender um trabalho sólido, coeso e enfeixado, em canções que podem não virar “hinos” como “Some Might Say” ou “Live Forever”, mas que, à guisa de fechamento de uma carreira exemplar para uma banda de rock, eles cumpriram a missão com êxito.



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quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Friends Of The Devil


O American Beauty, e...


Depois de participar das gravações do álbum
Deja Vu, do Crosby, Stills, Nash & Young, onde fez uma participação com uma steel guitar, Jerry Garcia se impressionou com o resultado: o fino do fino, um som fluído, escorreito, um country-rock de boa qualidade.

E, ao contrário do que era corrente no trabalho do Dead — cujo objetivo maior era trabalhar algumas canções exaustivamente no palco, em detrimento de se debruçar com mais afinco dentro do estúdio, ele resolveu mudar.

Eis que ele acabou trazendo muito dessa experiência para a sua banda. Em resultado disso, nasceram dois discos que mudaram o estilo do Grateful: o Workingman’s Dead e, principalmente American Beauty.

Eu particularmente comecei a curtir o Dead por causa desses dois discos mas, a despeito do fato do segundo ser muito mais incensado, eu gosto mesmo é do primeiro. Porém, na verdade, eu entendo ambos como um disco só, até pelo fato de que foram lançados num curtíssimo espaço de tempo (cinco meses) e contarem com a colaboração do Robert Hunter (tradutor norte-americano do Ranier Maria Rike & membro do Kool Aid Acid Test, já viu, etc), um excelente poeta e o melhor não-semi-pesudo membro do grupo de Jerry. E clássicos underrated, como Uncle John's Band, Dire Wolf e Casey Jones.


...o Workingsman's Dead

Para gravá-los, eles resolveram deixar o Pacific High Recording, de San Francisco para gravar no mesmo estúdio onde foi produzido Deja Vu, o mitológico Wally Heider Studio, berço de boa parte da produção do rock da Costa Oeste, desde Creedence Clearwater Revival (eles produziram o clássico Green River ali) até Quicksilver Messenger Service.

Inspirado na sonoridade simples e direta do CSN&Y, eles optaram agora por amansar o sincretismo épico do psicodelismo com o bluegrass para uma forma calcada no country clássico (não confundir com o Nashville Sound, mas um modelo oriundo do outlaw country e que se disseminaria à esfera do kitsch, nos anos 70).

A mística do Wally Heider trouxe boas vibrações na hora dos ensaios, sem contar com o fato de que o local virou uma espécie de Meca de gente como o pessoal do Jefferson Airplane, Carlos Santana e, como não podia deixar de ser, David Crosby e Neil Young. Nesse espírito, a linguagem folk e soft-country rock percorreu todas as faixas, mais curtas e menos viajandonas do que o material dos primeiros discos do Dead.



Além disso, destaca-se o papel do (excelente e subestimado) baixista Phil Lesh, que abre o disco cantando (pela primeira vez) Box of Rain, e Robert Hunter, pela excelência das letras de American Beauty.


Uma delas, Friend Of The Devil, conta a história de um fora-da-lei que é ajudado pelo demônio em seu plano de fuga, e que se tornaria um clássico da banda. O destaque nesta faixa é David Grisman, mandolinista de honestas jug bands que entrou no projeto por acaso: Garcia o achou na multidão numa arquibancada de um ordinário jogo de beisebol.

Candyman traz alusões desde à clichês do folk com conotações sobre drogas e sexo, estabelecendo uma tênue ligação entre o rural/atemporal ao urbano/contemporâneo. Além de Brokedown Palace, Ripple é outra pérola absurda de Lesh, a melhor do álbum:(se minhas palavras se esbroam com o fulgor do acaso/e as minhas melodias são entoadas com uma harpa desafinada/você escutaria minha voz através da música/você as adotaria se elas se aproximassem?/são apenas pensamentos desconexos/melhor deixa-las quietas, talvez/não sei, não me importo/deixe a melodia apenas preencher o ar).

Truckin’, a última de American Beauty, é uma divertida profissão-de-fé dos deads, contando as arguras e os infortúnios da vida de músico na estrada e alguns dissabores, como uma desagradável prisão por porte de dorgas (que, como diria aquele famoso guitarrista, eles tinham problemas com a Polícia, e não com as dorgas propriamente ditas) em Nova Orleans: (“ás vezes os faróis batem em mim/às vezes eu mel posso ver/depois eu me percebo de quão estranha essa viagem me parece”).



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domingo, 6 de junho de 2010

O Maior Show de Rock


At Fillmore East só no nome:
a foto foi tirada em outro lugar


Contratado como guitarrista freelancer pelo mítico estúdio Muscle Shoals, no Alabama, Duane Allman, então trabalhando lá como músico de apoio (um “pé de boi”, vamos dizer assim) foi destacado para viajar até Nova Iorque, em janeiro de 1969, para participar de uma sessão de gravação com a cantora Aretha Franklin. Lá, junto com o baixista Jimmy Johnson, ele assistiu a uma apresentação meteórica de Johnny Winter.

Na platéia, ele prometeu ao amigo:

— Em um ano, eu vou estar tocando aqui.

Proféticass palavas: nesse meio tempo, ele voltou ao Alabama, e teve a chance de formar uma nova banda (a anterior, Hour Glass, não deu muito certo).

Chamou seu irmão Gregg, mais Barry Oakley, Dickey Betts e Dickey Betts e Jai Joghanson e formou a The Allman Brothers.

Em novembro daquele no, se lançavam em disco. O segundo, de 1970, apenas conformou o que o primeiro já mostrava: uma banda de blues-rock versátil e completa, sem contar a própria sombra do talendo do auto-didata Duane, por muitos considerado o segundo maior guitarrista da história (atrás naturalmente apenas de Jimi Hendrix no gênero e pau a pau com Winter, por exemplo).

Conforme Duane vaticinara em dezembro de 1969 ele tocou com a banda no Fillmore East. Porém, a apresentação mais notável do sexteto ocorreu em março de 1971, e que se tornaria o mais aclamado disco deles, At The Fillmore East.

Partindo da concepção do blues, eles conseguiram transcender o gênero que os fixou, além de mostrarem, da forma mais exuberante, um dos maiores shows de rock de todos os tempos. A introdução que Duane faz de Statesboro Blues, cover de Blind Willie McTell é de arrepiar e explica porque Clapton fez questão de coloca-lo no Derek And The Dominos.



Whipping Post, a faixa que originalmente encerra o disco de estréia da banda, passa de cinco minutos em estúdio para uma versão éíca de mais de vinte minutos que, no entanto, não se vê o tempo passar, em suas variações de tempo e sucessões de artes de baixo, guitarra e Hammond (tocada por Gregg), que vai do blues-rock elementar ao cúmulo do progressivo, emoldurados pelo tempo delirante que Barry e Betts fazem com o contrabaixo e a bateria, numa performance delirante e assustadoramente genial.

In Memory Of Elizabeth Reed, também com a sua variação de tempos, por sua vez vai para os lados do rock latino de Carlos Santana, com uma linguagem deliciosamente jazzificada, onde prepassam os solos de Duane e Betts, o autor da música, que saiu originalmente no Idlewild South.

A guitarra de Duane viaja num solo extenso e livre, que depois é interseccionado por Gregg no órgão, lembrando vagamente a versão de My Favourite Things interpretada por John Coltrane, uma década antes.

A mesma estrutura coltraneana guitarra-teclado-guitarra eles usam em Hot Lanta, a primeira faixa do álbum. A versão de palco de In Memory Of Elizabeth Reed é tão acachapante que a platéia fica muda quando a banda encerra o tema, abruptamente.

Nunca o Fillmore East havia visto nada igual — e isso que o próprio Jimi Hendrix havia tocado lá no Ano Novo de 1969, com a Band Of Gypsies (e que também virou disco). E os dois shows que compõem At The Fillmore East, gravados dias 12 e 13 de março, seriam os últimos daquele templo do rock nova iorquino.

Em junho, ele fecharia suas portas (pelo menos, em grande estilo). At The Fillmore East também seria o canto do cisne de Duane Allman, que partiria seis meses depois do seu lançamento.





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