sexta-feira, 25 de abril de 2014
Make It Easy On Yourself
A capa
Burt Bacharach é aquele cara por detrás das canções que você gosta mas não sabe quem é o compositor.
Sempre tive as minhas reservas em relação a easy listening. Achava esses maestros uns usurpadores, se apropriando de canções para fazer um tipo de música detestável, para tocar em ambientes onde ela é acessória. Da mesma forma, os seus ouvintes são pusilanimemente de ocasião – sequer curtem o que estão ouvindo.
Fora que eles têm centenas de discos que vendem bem, mas que não tem coerência nenhuma: são coletâneas de canções para ouvir tomando o chá das cinco e tocavam nas extintas emissoras de rádio do tipo vitrolão, para umas audiência com uma indiferença de gatos.
Claro que nem todos são assim: cito como exemplo um Hugo Montenegro ou um Henry Mancini. Estes, por exemplo, pelo menos compunham o próprio material e detinham uma originalidade autoral que transcendia o arranjamento puro e simples.
Mas o cara que transcendeu de fato essa reputação nefasta do easy listening é o Burt Bacharach. Apesar do seu fundamento clássico (foi inclusive aluno do Milhaud, aquele do Boi No Telhado), ele sempre teve uma aproximação com a música popular a partir do jazz. Como muitos da sua geração, onde podemos incluir Carole King, começou como músico de estúdio e, a partir dos anos 50, se tornou um compositor do tipo Tim Pan Alley – gente insuspeita que fazia música por encomenda.
Nessa época emplacou Story Of My Life, com o Marty Robbins (“El Paso”) e Magic Moments com o Perry Como. Porém, virou uma espécie de cavalo de batalha da Dione Warwick. Junto com Hal David, eles seriam os que empurrariam Bacharach rumo aos umbrais da música popular. Warwick foi quem mais gravou Bacharach. Juntos, eles puserem quase quarente compactos no topo da parada da Billboard. A partir dela, muitos o regravariam e se tornariam fiéis intérpretes, como Dusty Springfield e Cilla Black (só para citar duas, no meio de tanta gente).
Burt trabalhou quase uma década como compositor e arranjador. Só foi lançar discos próprios lá por 1965, quando saiu o Hit Maker! Burt Bacharach Plays His Hits, pela Liberty.
No entanto, a melhor parte da sua discografia é a dos anos em que foi artista da Alpert & Moss, a A&M. O primeiro elepê dessa nova fase aparece quatro anos depois de seu début, com Reach Out. Na verdade, ele passa o seu repertório a limpo, em versões instrumentais. É o caso desse disco aqui, Make It Easy On Yourself, de 1970. Foi o primeiro dele que comprei (nunca achei o primeiro em vinil, apenas fui ouvi-lo com o advento da já falecida Usina do Som). Comprei os dois dois primeiros discos da A&M em sequência, acho que até na mesma loja. Gosto de ouvi-los especialmente porque eles me recordam exatamente a época em que os ouvi pela primeira vez – algo que todos têm, e isso me deixa um tanto nostálgico daqueles tempos.
Como ele fez no Reach Out, Bacharach canta numa faixa — no caso a que dá nome ao disco, Make It Easy On Yourself (um original de 1962, que rendeu à Dione Warwick o primeiro lugar nas paradas e aos Walker Brothers também, cerca de dois anos depois). Mesmo não sendo lá um grande cantor, a peça de resistência é, com efeito, a sua própria voz pequena. Sem sombra de dúvida, a melhor versão. Temas como Whoever You Are I Love You ou She’s Gone Away, por exemplo, são ligeiramente subestimadas, mas se notabilizam também pelo arranjo — coisa que Burt é mestre em transformar criações pop em pequenas suítes.
O disco ainda tem Any Day Now, que Elvis havia recém regravado, I’ll Never Fall In Love Again (cantada pelo coro feminino da orquestra e, é claro, This Guy’s In Love With You.
A história dela é bastante curiosa. Herb Alpert (um dos donos da A&M havia perguntado ao Burt se ele tinha alguma canção para mostrar-lhe. Bacharach não tinha nada. No entanto, se lembrou de que tinha uma canção dele — e que ele não levava muita fé nela, já com letra pronta, do Hal David. Resolveu repassá-la ao trompetista da Tijuana Brass.
Herb resolveu cantá-la (os discos da Tijuana Brass, como se sabe, são de música instrumental) e ficou dez semanas no primeiro lugar da Billboard. De Easy Listening.
Confesso que, graças ao Burt Bacharach, minha revolta contra música de elevador se aplacou para sempre.
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